quarta-feira, 30 de abril de 2008

CONSUMO SOLIDÁRIO E RESPONSÁVEL



O consumismo que a cultura do capital gestou está na base da fome de bilhões de pessoas e da atual falta de alimentos da humanidade

Por Leonardo Boff

Em primeiro lugar o consumo deve ser adequado à natureza do ser humano. Esta, por um lado, é material, enraizada na natureza e precisamos de bens materiais para subsistir. Por outro lado, é espiritual que se alimenta com bens intangíveis como a solidariedade, o amor, a acolhida e a abertura ao Infinito. Se estas duas dimensões não forem atendidas nos tornaremos anêmicos no corpo e no espírito. Em segundo lugar, o consumo precisa ser justo e equitativo. A Declaração dos Direitos Humanos afirma que a alimentação é uma necessidade vital e por isso um direito fundamental de cada pessoa humana (justiça) e conforme as singularidades de cada um (equidade). Não atendido este direito, a pessoa se confronta diretamente com a morte.

Em terceiro lugar, o consumo deve ser solidário. É solidário aquele consumo que supera o individualismo e se auto-limita por causa do amor e da compaixão para com aqueles que não podem consumir o necessário. A solidariedade se expressa pela partilha, pela participação e pelo apoio aos movimentos que buscam os meios de vida, como terra, moradia e saúde. Implica também a disposição de sofrer e de correr riscos que tal solidariedade comporta.

Em quarto lugar, o consumo há de ser responsável. É responsável o consumidor que se dá conta das conseqüências do padrão de consumo que pratica, se suficiente e decente ou sofisticado e suntuoso. Consome o que precisa ou disperdiça aquilo que vai faltar na mesa dos outros. A responsabilidade se traduz por um estilo sóbrio, capaz de renunciar não por acetismo mas por amor e em solidariedade para com os que sofrem necessidades. Trata-se de uma opção pela simplicidade voluntária e por um padrão conscientemente contido, que não se submete aos reclamos do desejo nem às solicitações da propaganda. Mesmo que não tenha consequências imediatas e visíveis, esta atitude vale por ela mesma. Mostra uma convicção que não se mede pelos efeitos esperados mas pelo valor que esta atitude humana possui em si mesma.

Por fim, o consumo deve ser realizador da integralidade do ser humano. Este tem necessidade de conhecimento e então consumimos os muitos saberes com o discernimento sobre qual deles convém e edifica. Temos necessidade de comunicação e de relacionamentos e satisfazemos esta necessidade alimentando relações pessoais e sociais que nos permitem dar e receber e nesta troca nos complementamos e crescermos. Às vezes esta comunicação se realiza participando de manifestações em favor da justiça, da reforma agrária, do cuidado pela água potável, da preservação da natureza, ou também vendo um filme, assistindo a um concerto, indo a um teatro, visitando uma exposição artística, participando de algum debate. Temos necessidade de amar e de sermos amados. Satisfazemos esta necessidade amando com gratuidade as pessoas e os diferentes de nós. Temos necessidade de transcendência, de ousarmos e de estarmos para além de qualquer limite imposto, de mergulharmos em Deus com quem podemos comungar. Todas estas formas de consumo realizam a existência humana em suas múltiplas dimensões.

Estas formas de consumo não custam e não gastam energia, pressupõem apenas o empenho e a abertura para a solidariedade, para a compaixão e para a beleza.

Tudo isso não traduz aquilo que pensamos quando falamos em felicidade?


Publicado originalmente em www.brasildefato.com.br em 28/04/2008

Foto: Nísio Miranda - Encontro da Comissão Especial da Fruticultura Mineira - ALMG -
Pirapora - MG em 01/09/2003

terça-feira, 29 de abril de 2008

SEMINÁRIO MINAS DE MINAS na (minha) Cidade dos Profetas












Congonhas receberá, em 08/05, a etapa de interiorização do Seminário Legislativo Minas de Minas, promovido pela Assembléia de Minas, do qual já falamos aqui.




Participe! É o seu futuro que está em jogo!



























Considero esta uma das mais importantes reuniões do Seminário, por tratar-se de um município que tem privilegiado a mineração como fonte de geração de emprego e renda, permitindo a exploração de suas jazidas à exaustão. A cidade tem tudo para ser um pólo turístico e de lazer, com suas atrações barrocas e paisagens exuberantes, além do famoso e bem estruturado Parque da Cachoeira.

O Jubileu do Bom Jesus do Matozinhos atrai milhares de fiéis todos os anos, há mais de duzentos anos, ao Município, o que, por si só, já se constitui num evento de propagação da exuberância da arte pela força da fé.

Não conseguimos compreender o porquê de, ainda assim, todos os seus gestores públicos, desde a sua emancipação política, nunca se empenharem em transformar essa vocação de atração por inúmeros atributos em realidade, para o bem da população e da sustentabilidade socioambiental da região.

Pouca gente sabe que as montanhas circundantes do núcleo urbano da cidade compõem o complexo paisagístico que se integra, que comunga com o conjunto arquitetônico criado pelo Mestre Antônio Francisco Lisboa, o "Aleijadinho", formando um belíssimo quadro. Entretanto, isso não impediu que a Companhia que explora a Mina Casa de Pedra rasgasse toda a extensão lateral da serra de mesmo nome, deixando uma ferida aberta de frente para as obras do Aleijadinho. O que é pior: segundo trabalhadores da própria companhia, a montanha desaparecerá em alguns anos.
Veja abaixo um quadro apresentado no site do próprio Município sobre a sua economia:
ECONOMIA

Congonhas está entre as quinze cidades que mais arrecada impostos em Minas Gerais. A principal origem destes impostos é o ICMS gerado pela empresas de extração de minério de ferro e pela Açominas. Já foi a primeira cidade em renda per-capita entre os mais de 700 municípios do Estado.

Mineração Casa de Pedra (CSN) Pertencente à
Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), até pouco tempo era responsável por 100% do minério de ferro consumido na siderúrgica em Volta Redonda. Já teve cerca de 1500 trabalhadores, hoje cerca de 600 funcionários e é uma das empresas mais tradicionais da região.

Ferteco Mineração S/A - A Ferteco Mineração S/A, era uma multinacional alemã, hoje pertencente à CVRD - Vale. Produz minério de ótima qualidade. Já teve quase 2000 funcionários e hoje tem cerca de 700 funcionários. Sua produção é destinada à exportação.


Ou seja, a tendência é que o número de empregados diminua ainda mais, com a utilização de novas tecnologias e até com a diminuição da própria capacidade de produção da jazida. Os lucros? Só AUMENTAM! Batem recordes a cada novo balanço. E a cidade?
Após a safra única do minério de ferro da região, como dito acima, "destinada à exportação", sem agregação de valor à matéria-prima, o que farão os habitantes de Congonhas? Viverão de quê?
Com a imensurável degradação do solo e a (in)consequente explotação dos recursos hídricos e minerais, pelo rebaixamento dos lençóis freáticos, pela supressão da vegetação nativa, o futuro que se desenha para a região não é dos mais promissores. 

A população tem que participar, dar suas sugestões, cobrar dos governantes uma posição de vanguarda quanto à diversificação econômica, à profícua utilização dos recursos da CFEM e ao aumento de sua alíquota arrecadada; à criação de novos espaços e fronteiras profissionais, à preservação do patrimônio ambiental, arquitetônico, paisagístico e cultural, sem as quais Congonhas e inúmeros outros municípios mineradores de Minas Gerais e do País tendem a tornar-se futuras cidades-fantasmas, desertas e sem vida.
As fotos do Parque da Cachoeira (piscina) e dos Profetas com o pôr-do-sol mostram ao fundo parte da montanha que irá desaparecer.

quinta-feira, 24 de abril de 2008

SEMINÁRIO MINAS DE MINAS - Mais etapas de interiorização

E quando as minas se exaurirem?!...




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A participação de todos é muito importante!

Divinópolis e Itaúna discutem cadeia produtiva da mineração

Divinópolis e Itaúna, no Centro-Oeste mineiro, recebem a terceira e quarta etapas de interiorização do Seminário Legislativo Minas de Minas da Assembléia Legislativa de Minas Gerais, nos dias 28 e 29 próximos, respectivamente. Em Divinópolis, o seminário se realiza na Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg), à rua Engenheiro Benjamim de Oliveira, 144-A - Esplanada, a partir de 8h30; e em Itaúna no Centro de Desenvolvimento Empresarial, à rua Capitão Vicente, 129, Centro. Na primeira, os debates vão se concentrar na mineração em áreas cársticas (calcário), consideradas de interesse ambiental. E na segunda, o destaque fica por conta das fundições de ferro, concentrando produção e perspectivas de investimento.

O Seminário Legislativo Minas de Minas é realizado pela ALMG, e conta com a parceria de entidades do setor produtivo, ambientalistas, trabalhadores e órgãos públicos. O objetivo é discutir a cadeia produtiva da mineração para elaborar uma política minerária estadual e colher sugestões para aprimorar a política nacional. Depois de 11 encontros regionais em abril e maio, acontece a etapa final em Belo Horizonte, de 9 a 12 de junho.

A 115 quilômetros de Belo Horizonte, com uma população de 205 mil de habitantes, Divinópolis terá como um dos palestrantes, a superintendente regional da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, no Alto São Francisco, Maria Cláudia Pinto. Ela destaca como preocupação principal da região a mineração em áreas cársticas, "que além do afloramento mineral do calcário e granito, guardam importantes sítios espeleológicos e arqueológicos, sobretudo em Arcos e Pains". Ela informa ainda que tais áreas são alvo de irregularidades, como a mineração clandestina e o uso de explosivos indiscriminadamente.Etapas - O calendário de encontros regionais do Seminário Legislativo Minas de Minas é: Itabira (23/4); Poços de Caldas (25/4); Divinópolis (28/4), Itaúna (29/4); Sete Lagoas (6/5); Congonhas (8/5); Araxá (13/5); Paracatu (15/5); Muriaé (20/5); Teófilo Otoni (27/5); e Governador Valadares (29/5).

Royalties da mineração - As cidades mineradoras da região, 26, foram responsáveis por um recolhimento da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (Cfem), de cerca de R$ 370 milhões no ano passado, retornando para a região um percentual de R$ 6 milhões. Divinópolis recolheu R$ 8 milhões e recebeu R$ 51 mil. Itaúna recolheu cerca de R$ 21 milhões e recebeu R$ 312 mil.

Itaúna, a 79 quilômetros de Belo Horizonte, com uma população de mais de 85 mil habitantes, tem na indústria o carro-chefe de sua economia, com destaque para a siderurgia de aço e ferro-gusa. Na área de metalurgia básica há nove fundições, e nas áreas de extração de minerais metálicos e não-metálicos existem três empresas. A cidade conta com reservas de argila e ferro, de acordo com relatório do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM). A cidade é a terceira a ter um escritório da Associação Brasileira de Fundição (Abifa) e também a contar com a Escola de Fundição Marcelino Corradi, do Senai.

Em Divinópolis o seminário será aberto pelo presidente da ALMG, deputado Alberto Pinto Coelho (PP), pelo prefeito da cidade, Demétrius Arantes Pereira e pelo presidente da Câmara Municipal, vereador Marcos Vinícius Alves da Silva. Em seguida, acontecem palestras sobre contexto regional da mineração, com a superintendente Regional de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável do Alto São Francisco, Maria Cláudia Pinto; o membro do Conselho da Unidade Regional do Colegiado do Alto São Francisco, representando a Associação Brasileira de Engenharia Sanitária - (ABES), Francisco de Assis Braga; e o vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), Edwaldo Almada de Abreu. Depois, acontecem discussões em grupos de trabalhos, sobre legislação, sustentabilidade, gestão ambiental e perspectivas do setor.

Responsável pela informação: Assessoria de Comunicação - ALMG - 31 - 2108 7715

quarta-feira, 23 de abril de 2008

"A UTOPIA É O QUE IMPEDE O ABSURDO DE TOMAR CONTA DA HISTÓRIA." por Leonardo Boff)

O pensamento de Eduardo Galeano e Leonardo Boff, em dois artigos recebidos através do excelente boletim da Agência Envolverde - Revista Digital de Meio Ambiente e Desenvolvimento

A NATUREZA NÃO É MUDA - Por Eduardo Galeano*




O Equador está discutindo uma nova Constituição. Entre as propostas, abre-se a possibilidade de reconhecer, pela primeira vez na história, os direitos da natureza. Parece loucura querer que a natureza tenha direitos. Em compensação, parece normal que as grandes empresas dos EUA desfrutem de direitos humanos, conforme foi aprovado pela Suprema Corte, em 1886.

O mundo pinta naturezas mortas, sucumbem os bosques naturais, derretem os pólos, o ar torna-se irrespirável e a água imprestável, plastificam-se as flores e a comida, e o céu e a terra ficam completamente loucos.

E, enquanto tudo isto acontece, um país latino-americano, o Equador, está discutindo uma nova Constituição. E nessa Constituição abre-se a possibilidade de reconhecer, pela primeira vez na história universal, os direitos da natureza.

A natureza tem muito a dizer, e já vai sendo hora de que nós, seus filhos, paremos de nos fingir de surdos. E talvez até Deus escute o chamado que soa saindo deste país andino, e acrescente o décimo primeiro mandamento, que ele esqueceu nas instruções que nos deu lá do monte Sinai: "Amarás a natureza, da qual fazes parte".

Um objeto que quer ser sujeito

Durante milhares de anos, quase todo o mundo teve direito de não ter direitos.
Nos fatos, não são poucos os que continuam sem direitos, mas pelo menos se reconhece, agora, o direito a tê-los; e isso é bastante mais do que um gesto de caridade dos senhores do mundo para consolo dos seus servos.

E a natureza? De certo modo, pode-se dizer que os direitos humanos abrangem a natureza, porque ela não é um cartão postal para ser olhado desde fora; mas bem sabe a natureza que até as melhores leis humanas tratam-na como objeto de propriedade, e nunca como sujeito de direito.

Reduzida a uma mera fonte de recursos naturais e bons negócios, ela pode ser legalmente maltratada, e até exterminada, sem que suas queixas sejam escutadas e sem que as normas jurídicas impeçam a impunidade dos criminosos. No máximo, no melhor dos casos, são as vítimas humanas que podem exigir uma indenização mais ou menos simbólica, e isso sempre depois que o mal já foi feito, mas as leis não evitam nem detêm os atentados contra a terra, a água ou o ar.

Parece estranho, não é? Isto de que a natureza tenha direitos... Uma loucura. Como se a natureza fosse pessoa! Em compensação, parece muito normal que as grandes empresas dos Estados Unidos desfrutem de direitos humanos. Em 1886, a Suprema Corte dos Estados Unidos, modelo da justiça universal, estendeu os direitos humanos às corporações privadas. A lei reconheceu para elas os mesmos direitos das pessoas: direito à vida, à livre expressão, à privacidade e a todo o resto, como se as empresas respirassem. Mais de 120 anos já se passaram e assim continua sendo. Ninguém fica estranhado com isso.

Gritos e sussurros

Nada há de estranho, nem de anormal, o projeto que quer incorporar os direitos da natureza à nova Constituição do Equador.

Este país sofreu numerosas devastações ao longo da sua história. Para citar apenas um exemplo, durante mais de um quarto de século, até 1992, a empresa petroleira Texaco vomitou impunemente 18 bilhões de galões de veneno sobre terras, rios e pessoas. Uma vez cumprida esta obra de beneficência na Amazônia equatoriana, a empresa nascida no Texas celebrou seu casamento com a Standard Oil. Nessa época, a Standard Oil, de Rockefeller, havia passado a se chamar Chevron e era dirigida por Condoleezza Rice. Depois, um oleoduto transportou Condoleezza até a Casa Branca, enquanto a família Chevron-Texaco continuava contaminando o mundo.

Mas as feridas abertas no corpo do Equador pela Texaco e outras empresas não são a única fonte de inspiração desta grande novidade jurídica que se tenta levar adiante. Além disso, e não é o menos importante, a reivindicação da natureza faz parte de um processo de recuperação das mais antigas tradições do Equador e de toda a América. Visa a que o Estado reconheça e garanta o direito de manter e regenerar os ciclos vitais naturais, e não é por acaso que a Assembléia Constituinte começou por identificar seus objetivos de renascimento nacional com o ideal de vida do sumak kausai. Isso significa, em língua quechua, vida harmoniosa: harmonia entre nós e harmonia com a natureza, que nos gera, nos alimenta e nos abriga e que tem vida própria, e valores próprios, para além de nós.

Essas tradições continuam miraculosamente vivas, apesar da pesada herança do racismo, que no Equador, como em toda a América, continua mutilando a realidade e a memória. E não são patrimônio apenas da sua numerosa população indígena, que soube perpetuá-las ao longo de cinco séculos de proibição e desprezo. Pertencem a todo o país, e ao mundo inteiro, estas vozes do passado que ajudam a adivinhar outro futuro possível.

Desde que a espada e a cruz desembarcaram em terras americanas, a conquista européia castigou a adoração da natureza, que era pecado de idolatria, com penas de açoite, forca ou fogo. A comunhão entre a natureza e o povo, costume pagão, foi abolida em nome de Deus e depois em nome da civilização. Em toda a América, e no mundo, continuamos pagando as conseqüências desse divorcio obrigatório.

* Publicado originalmente no semanário Brecha, do Uruguai. Tradução: Naila Freitas / Verso Tradutores

Recebido da Agência Envolverde (Texto e Imagem)

© Copyleft - É livre a reprodução exclusivamente para fins não comerciais, desde que o autor e a fonte sejam citados e esta nota seja incluída. http://envolverde.ig.com.br
EDUCAÇÃO ECO-CENTRADA - Por Leonardo Boff*

Há duas portas de entrada para a educação e para a socialização da vida humana: a família e a escola. Da família herdamos ou não o sentido da acolhida e da auto-confiança (da mãe) e o sentido dos limites e a percepção de valores éticos (do pai). A escola, alem que repassar informações, se propõe o objetivo de criar as condições para a formação de pessoas autônomas com competência para plasmar o próprio destino e aprender a conviver como cidadãos participativos. A educação, nesta perspetiva, era centrada no ser humano e na sociedade.

Esse propósito correto é hoje insuficiente. Depois que irrompeu o paradigma ecológico, nos conscientizamos do fato de que todos somos ecodependentes. Não podemos viver sem o meio-ambiente, com seus ecossistemas, que incluído o ser humano, forma o ambiente inteiro. Somos um elo da comunidade biótica. A humanidade não está frente à natureza, nem acima dela como donos mas dentro dela como parte integrante e essencial. Participamos de uma comunidade de interesses com os demais seres vivos que conosco compartem a biosfera. O interesse comum básico é manter as condições para a continuidade da vida e da própria Terra, tida como superorganismo vivo, Gaia.

O fato novo, até ha pouco ausente na consciência coletiva da grande maioria e também de cientistas, é que todo o sistema de vida está correndo risco. É conseqüência de uma civilização produtivista/consumista/materialista que tem predominado nos últimos séculos, hoje globalizada. Ela fez com que a Terra perdesse seu frágil equilíbrio e sua capacidade de autoregeneração. Temos que impedir que Gaia entre num processo de caos, buscando através dele um novo equilíbrio, mas à custa de pesados sacrifícios ecológicos como a dizimação de milhares de espécies, cataclismos, secas, inundações, insegurança alimentar em vastas proporções e, eventualmente, o desaparecimento de incalculável número de seres humanos.
A partir de agora a educação deve impreterivelmente incluir as quatro grandes tendências da ecologia: a ambiental, a social, a mental e a integral ou profunda (aquela que discute nosso lugar na natureza e nossa inserção na complexa teia das energias cósmicas). Mais e mais se impõem entre os educadores ambientais esta perpectiva: educar para a arte de viver em harmonia com a natureza e propor-se repartir equitativamente aos demas seres, os recursos da cultura e do desenvolvimento sustentável.

Precisamos estar conscientes de que não se trata apenas de introduzir corretivos ao sistema que criou a atual crise ecológica mas de educar para sua transformação. Isto implica superar a visão reducionista e mecanicista ainda imperante e assumir a cultura da complexidade. Ela nos permite ver as interrelações do mundo vivo e as ecodependências do ser humano. Tal verificação exige tratar as questões ambientais de forma global e integrada.

Deste tipo de educação se deriva a dimensão ética de responsabilidade e de cuidado pelo futuro comum da Terra e da humanidade. Faz descobrir o ser humano como o cuidador do jardim do Éden que é nossa Casa Comum e o guardião de todos seres. A democracia além de ser sem fim como o quer com razão Boaventura de Souza Santos, será também uma democracia sócio-ecológica. Junto com a cidadania (que vem de cidade) estará a florestania( que vem de floresta), ensaiada pelo governo petista do Acre. Ser humano e natureza se pertencem mutuamente e juntos devem construir um caminho de convivência não destrutiva.

Leonardo Boff é teólogo, escritor, professor emérito de ética da UERJ e membro da Comissão da Carta da Terra.

Publicado originalmente em http://envolverde.ig.com.br em 07/04/2008 - 11h04

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terça-feira, 22 de abril de 2008

Seminário Legislativo : MEIO AMBIENTE, MINERAÇÃO E SOCIEDADE






Democracia Participativa: instrumento de mudanças e reestruturação.

Faça parte desse processo! Ajude a decidir nosso futuro!


A Assembléia Legislativa de Minas Gerais lança hoje (22) Seminário Minas de Minas

A Assembléia lança hoje (22), às 15h30, no Salão Nobre, o
Seminário Legislativo Minas de Minas, que discutirá os amplos aspectos da cadeia produtiva da mineração no Estado. O objetivo é buscar subsídios para elaborar uma política minerária estadual orientada para a sustentabilidade e para aprimorar a política nacional. Participam representantes de empresários, trabalhadores, acadêmicos e da sociedade civil. A primeira fase, de interiorização, começa amanhã (23), em Itabira, e se estende por outras dez cidades, com palestras de especialistas, debates e discussões em grupos. Todas as sugestões serão consolidadas na etapa final, entre os dias 9 e 12 de junho, no Plenário, em Belo Horizonte. Leia mais

NÃO VERÁS PAÍS NENHUM - Mais uma pelo Dia do Planeta Terra, por Nísio Miranda











Prezados (as) Eco-cidadãos,
Saúde e Paz!

Às vezes me perguntam onde e quando comecei a me preocupar com a preservação da Natureza. Nas andanças pelas audiências públicas, nos encontros ambientalistas, entre uma conferência do meio ambiente, um seminário, um ciclo de debates e outros eventos, me perguntam porque, quais as razões me levaram a abraçar a causa e outras curiosidades que as pessoas têm, principalmente num mundo em que se faz quase tudo por "modismos" ou "ondas". Confesso que não me lembro, a não ser no que me remete às atitudes primordiais mais simples, como guardar um papel no bolso para depois jogá-lo no lixo, e não na rua; não lançar nada nos córregos e rios, nem em bueiros; não desperdiçar água; não provocar incêndios nas matas; em minhas incursões pela natureza, deixá-la como eu a encontrar, dentre outras. Estes foram tópicos constantes no variado temário do nosso processo educativo, encabeçado pelo meu pai, um intelectual (de grandiosa humildade, mesmo sabendo tudo o que sabia) visionário e idealista; e minha mãe, educadora - na essência mais profunda da palavra - por uma vida inteira; além do convívio com uma família pródiga na multiplicação de educadores e estudiosos de tudo, além de uma rápida passagem pelo universo do escotismo.

O que sei é que a leitura deste livro foi, sem dúvida, um dos grandes impulsos que tive, tanto pela abordagem de indiscutível pesquisa e conhecimento - e nem por isso menos dramática e quase didática - dos assuntos inerentes ao efeito estufa, à desqualificação e à crescente inacessibilidade dos recursos hídricos, ao oxigênio gradualmente rarefeito e outras mazelas (lá se vão mais de vinte anos que o li e reli!), quanto pelo susto que ele me pregou, pelo realismo e a força de sua narrativa. Até hoje tenho meu exemplar em casa e devo admitir que, nas raras vezes em que lhe corro os olhos (há algum tempo não o faço), não me arrisco a enveredar pela sua leitura completa novamente, com um certo temor de reviver o meu sofrimento - lúdico, mas sofrimento! - e até uma não diagnosticada, mas sentida, inicial crise depressiva.

Deveria ser leitura obrigatória - nas escolas, no comércio, na indústria, nos campos, nas repartições públicas, nas ONG's, nas igrejas e em todo lugar do mundo onde a ínfima possibilidade de ameaça à integridade e à harmonia ambiental existe - este petardo profético-ambientalista do mestre Ignácio de Loyola Brandão (foto), para que possamos começar a esboçar a nossa própria salvação.

Oxalá não se me cerrem os olhos antes desta ansiada insurreição!...
Com um ecofraterno abraço,

Nísio Miranda.

Abaixo, entrevista do autor, concedida com exclusividade para o portal "Conservação On-line", da Fundação O Boticário, em http://internet.boticario.com.br/portal/site/fundacao/

VINTE E CINCO ANOS DE "NÃO VERÁS PAÍS NENHUM", de Ignácio de Loyola Brandão.
A realidade imitando a ficção




Um dos mais consagrados escritores brasileiros, Ignácio de Loyola Brandão, teve seu livro "Não verás país nenhum" relançado pela Editora Global, em edição comemorativa aos 25 anos da obra. Em tempos de mudanças climáticas, o cenário do livro de ficção – com a natureza destruída em nome do "progresso" – nos mostra uma realidade que começa a se desenhar hoje.
Confira abaixo a entrevista do autor, concedida com exclusividade para o Conservação On-line:
CO - Quando a primeira edição do livro "Não Verás País Nenhum" foi lançada, em 1981, você já tinha feito uma pesquisa com notícias de catástrofes ambientais e doenças causadas por poluição, por exemplo, para ambientar o romance num futuro cronológico. Como foi seu contato com essa realidade social e ambiental na época?
Ignácio de Loyola Brandão - Tinha feito uma enorme pesquisa em torno dos assuntos principais que permeiam o livro: clima, hidrografia, buraco de ozônio na atmosfera, poluição, devastação e doenças estranhas causadas pelo sol, pelo aquecimento e pela poluição. Principalmente as doenças me assustavam muito. Levei dois anos lendo todos os tipos de estudos sobre o assunto, li até mesmo a mitologia da árvore, o simbolismo da floresta para o homem, o sentido religioso da árvore, o significado da água para o ser humano. Diria que a bibliografia para o livro oscilou em torno de uns 80 livros anotados, rabiscados, lidos e relidos. Ao mesmo tempo, devorava todos noticiários que envolvessem esses assuntos em jornais, revistas, panfletos, folhetos, teses. Reuni cerca de 4 mil recortes sobre os temas. A professora da PUC de São Paulo Cecília de Almeida Salles teve todo esse material em mãos e preparou inclusive uma tese de mestrado em torno da Genealogia do manuscrito. Foi o primeiro livro sobre o assunto publicado no Brasil.

CO - Alguns aspectos ambientais descritos no livro parecem estar acontecendo nos dias atuais. Dias mais quentes, racionamento de água e de energia, florestas desaparecendo. Você imaginava que isso pudesse virar realidade num futuro tão próximo?
ILB - O escritor, o ficcionista explora seu tema elevando-o ao máximo, até o ponto em que ele se torna quase absurdo. A cada situação eu esticava a corda a sua tensão maior, mesmo porque, olhando em torno, não via nenhum gesto, nenhum movimento por parte da elite dirigente, não via manifestações — escrevi o livro em meados dos anos 70 — que alertassem a população, orientassem, gritassem: basta! A não ser os trabalhos do gaúcho Lutzenberger e de Ruschi, no Espírito Santo. Pensava: se continua assim, vamos chegar onde? Minha intenção era assustar, provocar uma reação de terror, para que as pessoas lendo o livro dissessem: não podemos permitir que isso aconteça. E, no entanto, está acontecendo, virou realidade. Vejam as denúncias dos jornais ainda nesta semana: a Amazônia continua a ser devastada.
CO - Você acredita que a edição especial de relançamento do livro, 25 anos depois da primeira edição, contribui para reforçar o alerta à sociedade sobre a questão ambiental – embora o livro seja um romance de ficção?
ILB - Minha responsabilidade como escritor é alertar, mostrar o mundo que vivemos, a vida como ela é. Em Não Verás País Nenhum temos uma não vida. Acredito que o movimento que está sendo feito em torno desta edição especial é uma das formas de alertar, de dar um grito, de dizer: vamos nos mexer, nos agitar, gritar, agir para evitar a catástrofe. Embora ficção, o romance tem sido visto quase como um documentário. O que mostra que já existe um espírito, uma consciência em torno de tema tão grave.
CO - Oportunidades como o debate na FNAC (que acontecerá em 5 de dezembro, na FNAC-Barigui, em Curitiba), por exemplo, podem expor esse cenário como ponto de partida para repensarmos nossa relação com o planeta?

ILB - Cada gesto, mínimo que seja, contribui para o esclarecimento, a conscientização. Um evento como este na FNAC, instituição que tem prestígio, levada para a frente por outra instituição — porque, convenhamos, o Boticário, mais do que uma empresa, é hoje uma instituição — são fundamentais. Uma ação aqui, uma palavra ali, um texto, uma fala, um livro, tudo é essencial, tudo passa a fazer parte de uma engrenagem a fim de que possamos ver algum País no futuro.
CO - "Não verás país nenhum" obteve grande sucesso, assim como outras obras de sua autoria. Ganhou inclusive versão em teatro, sob direção de Júlio Maciel. Você acredita que a literatura e as artes em geral são capazes de mobilizar a sociedade para uma consciência coletiva? Na sua opinião, a mudança de hábitos visando a sustentabilidade do planeta é uma realidade possível?
ILB - Mais do que possível. Acredito no ser humano. Não acredito que o homem seja suicida. Há um leve movimento destinado a reverter tudo. Agora, a coisa começou a assumir um contexto global. O Nobel dado a Al Gore tem um significado. Começamos a nos mover, ainda que lentamente para nos salvarmos. Mais do que nunca a mídia se debruça sobre o assunto. Veja o enorme caderno dedicado ao Amazonas pelo jornal O Estado de S. Paulo no domingo, dia 25 de novembro. Estamos começando a ter medo, e isso é bom. Começamos com o pequeno gesto de não atirar lixo na rua, continuamos reciclando lixo, tratando de usar detergentes que não agridam o meio ambiente, as empresas cuidam da emissão de gás carbônico, o Ministério do Meio Ambiente torna-se dia a dia mais exigente. Do micro chegaremos ao macro.
CO - O tema meio ambiente percorreu outra obra sua, o "Manifesto Verde", que aborda a ecologia partindo de fatos reais ocorridos no Brasil e no mundo. É um livro que incentiva o leitor a repensar seu comportamento diante da natureza. Essa é uma preocupação presente em sua vida?

ILB - Tenho ainda outro pequeno livro infantil, O Homem Que Espalhou o Deserto, forte, que fala do assunto. Diria que ele é uma das preocupações, desde que senti a faca na carne, pesquisando tanto e me informando. Lembro-me de um fato da infância. Adorávamos brincar num riacho em Araraquara, interior do estado de São Paulo, porque era uma época em que quase não havia brinquedos. Ao menos não havia a exorbitância que existe hoje. Tínhamos de inventar, de usar a natureza. Vivíamos em total contato com a natureza. O rio era maravilhoso, nadávamos, fazíamos ilhas, pontes, tudo. Um dia, começaram a jogar esgotos no riacho, as águas passaram a feder, os pais, preocupados, proibiram os filhos de ir brincar. A gente ia brincar e saía cheio de merda. Um dia, vimos que tínhamos perdido o nosso maior divertimento, o grande prazer, a vida ficou mais chata, triste. O rio passou a se chamar Rio das Bostas. Odioso, mal cheiroso. Foi o primeiro contato que tive com o problema. Tudo isso me veio à cabeça quando escrevia Não Verás. Não quero, simbolicamente, que a gente veja o mundo mergulhado no excremento.
Serviço:
Não Verás País Nenhum - Edição Comemorativa 25 Anos
Autor: Ignácio de Loyola Brandão (Global Editora)
Para comprar o livro, acesse o site http://www.globaleditora.com.br/

Salvemo-nos a nós mesmos, salvando a TERRA!


Prezadas e prezados eco-cidadãos,
saudações fraternas!

Melhor dia não teríamos para colocar no ar, pela primeira vez, o nosso "Eco-cidadania Ativa"!


22 de abril - Dia Internacional do Planeta Terra
E em 2008 - Ano Internacional da Terra!


Que possamos refletir sobre o que representa a preservação do nosso Planeta, a recuperação de nossas nascentes, a manutenção da saúde de nossos solos e biomas, o estudo e a conservação da biodiversidade da nossa morada. Como ponto-de-partida, a idéia de que preservando-a, estaremos, de forma proativa, preservando as nossas próprias vidas.

Abaixo, uma canção dos mineiros do grupo "14 Bis", que nos remete à necessária reflexão.
Que sejamos humildes e atentos ao que a Natureza quer nos dizer e deseja de nós e nossas atitudes.
O Eco-cidadania Ativa está no ar e espera receber muitas contribuições para este debate tão importante e urgente.
Saúde e Paz para todos!

Um feliz Dia da Terra para todos os eco-cidadãos e cidadãs que lutam todos os dias do ano pela sua conservação!


Planeta Sonho


Flávio Venturini
Composição: Flávio Venturini / Vermelho/ M.Borges

Aqui ninguém mais ficará depois do sol
No final será o que não sei mas será
Tudo demais
Nem o bem nem o mal
Só o brilho calmo dessa luz
O planeta calma será terra
O planeta sonho será terra,
E lá no fim daquele mar
A minha estrela vai se apagar
Como brilhou
Fogo solto no caos
Aqui também é bom lugar de se viver
Bom lugar será o que não sei mas será
Algo a fazer
Bem melhor que a canção
Mais bonita que alguém lembrar
A harmonia será terra
A dissonância será bela
E lá no fim daquele azul
Os meus acordes vão terminar
Não haverá
Outro som pelo ar
O planeta sonho será terra
A dissonância será bela
E lá no fim daquele mar
A minha estrela vai se apagar
Como brilhou
Fogo solto no caos

DAS TRANSPOSIÇÕES SILENCIOSAS


Por Nísio Miranda

Adital - 11.05.07 - BRASIL

1 - Sobre o que hoje existe


Nos dias 26/04 e 03/05 pp. presenciei, entre surpreendido, feliz e estupefato, reacender-se a chama das discussões em torno do Projeto de Integração de Bacias do Rio São Francisco - como querem uns - ou simplesmente transposição do Rio São Francisco - como insistem outros - em debates patrocinados pela bancada do PT e do PC do B na Assembléia Legislativa de Minas. Dispuseram-se a expor suas idéias, agressivamente antagônicas, no primeiro dia, o deputado federal Ciro Gomes, ex-ministro da pasta gestora do projeto e, no outro, o professor Dr. João Abner, da UFRN.

Não prezo correr do debate, nem fugir à luta, como bom filho da pátria que sou. Mas confesso que preferiria ver a minha geração livre da sina e da missão desta encruzilhada nacional histórica e sei que muitos outros gostariam de se ver bem longe deste "cálice". Mas melhor é que nos empenhemos em juntos - e NUNCA dispersos - buscar a solução mais harmônica possível, sob todos os aspectos. Nem sou do tipo que é contra, simplesmente por ser, ou a favor, pelo mesmo motivo. Por isso - e por questões profissionais e ideológicas - tenho feito questão de participar da maioria dos debates e palestras sobre o tema. E em nova confissão, rasgo meu peito ufanista: sou radicalmente a favor da REVITALIZAÇÃO URGENTE das bacias de todos os rios do meu País, a favor do Meio Ambiente saudável, da vida plena e digna para todos! Creio piamente na origem divina do homem, que o ilumina e permite escolher dentre dois caminhos o que melhor conduzir para que às próximas gerações sejam garantidas qualidade de vida, no mínimo equivalente à nossa, e mais oportunidades de dignidade e plenitude no viver. Para todos os povos do mundo e, principalmente, para a nação brasileira.

Isto posto, digo a que venho: como não poderia deixar de ser, chamar nossos leitores e leitoras à reflexão, diante de alguns fatos e argumentos.

Utiliza-se, no Brasil e no mundo, um meio de transporte de minerais chamado "mineroduto". Causou-me surpresa - e antecipadamente reconheço a minha ignorância - saber que o mais antigo desses dutos no Brasil encontra-se em operação há 30 anos. Isso mesmo: 30 anos! Ele é o marco-zero da existência de uma mineradora, que eu soube somente a alguns dias, quando anunciaram a sua expansão e divulgaram a "comemoração", em 11 de maio, do início de seu funcionamento, no ano de 1977.

Curioso que sou, pus-me em busca de mais informações sobre o engenho, a ponto de não resistir e escrever estas provocativas linhas, após muitas conversas com amigos que conhecem muito mais do que eu de inúmeras coisas, e alguma pesquisa aqui e acolá, de muitos escritos. O mais extenso condutor de minério do mundo, bem debaixo do meu nariz (congonhense que sou, lafaietense nascido), possui 396 Km, ligando uma mina em Mariana -MG, a uma usina de pelotização, em Anchieta-ES. Já transportou, em 28 anos de operação diuturna, cíclica e interminável (?), em uma viagem que dura aproximadamente sessenta e três horas, a 6,5 km/hora, passando por 24 municípios dos dois estados, a bagatela de 239 milhões de toneladas de concentrado (ou polpa) de minério de ferro, segundo dados da própria empresa. Grandes números para as minas gerais!

Para este transporte da polpa (ou seja, um minério absoluto, um extrato, sem resíduos, fruto da redução de muito mais quantidade de minério, é o que entendemos), estima-se um gasto de, aproximadamente, um litro de água para cada três quilos (três quilos!) de minério EXPLORADO.
Aí perguntamos: quanto de MINÉRIO se explorou para chegar à quantidade de POLPA transportada nos últimos 28 anos? Levando-se em consideração somente o montante transportado, quanto de água foi consumido? Alguém já fez a conta? E o que é feito desta água lá na ponta? É reutilizada? Irriga algum pedaço de terra? Serve para dessedentar animais ou gente? Lá na ponta, perguntamos. Porque ao longo da viagem já sabemos que ela não serve para outra coisa a não ser o transporte do produto...

E ainda: quanto de energia é gasto para o bombeamento desta lama? O que os municípios recebem pela passagem do empreendimento em seus territórios? Tem sido compensatório para eles o retorno financeiro da atividade exploratória (CFEM)?

 - Sobre o que vem por aí

Segundo publicações especializadas, uma empresa nacional, em consórcio com uma multinacional, está investindo aproximadamente R$4,8 bilhões (US$ 2,35 bilhões) na implantação de um complexo de exploração e transporte de minério de ferro, composto por uma mina, localizada no município de Conceição do Mato Dentro, e uma usina de pelotização que será implantada no Estado do Rio de Janeiro, nos domínios do Porto de Açu, município de São João da Barra. O processo será o mesmo do exemplo anterior: explora-se o minério, transforma-se-o em polpa e transporta-se esta polpa até o porto pelo mineroduto de 525 Km de extensão.

Além de admitir, em seu relatório de Impacto ambiental, que é "inevitável" a supressão de mata nativa por onde o mineroduto passará (mais de vinte municípios mineiros, parques naturais federais, estaduais e municipais, além de áreas de proteção ambiental), os empreendedores já foram autuados pelo órgão fiscalizador do Sistema Estadual de Meio Ambiente (Sisema) de Minas, e suas atividades suspensas por extrapolarem a autorização que tinham para desmatamento, abrindo mais de 20 quilômetros de estradas sem a necessária autorização! Os técnicos constataram, ainda: a abertura irregular de estradas para acesso às áreas de perfurações de pesquisa mineral, a obstrução de um canal de drenagem de água pluvial pela construção das estradas, extração de cascalho para a manutenção delas, intervenção em áreas de preservação permanente (APP) e captação de água. O mais lastimável: a região integra a Serra do Espinhaço, elevada a "Reserva da Biosfera" em 2005, por declaração da Unesco, pela diversidade e riqueza natural que engloba.

De acordo com a fiscalização, os empreendedores têm apenas alvará de pesquisa mineral, concedido pelo Departamento Nacional de Pesquisa Mineral (DNPM) e a autorização para exploração florestal (Apef), do IEF-MG, que autoriza a supressão de 22,4 hectares numa área conhecida como Serra do Sapo, de onde pretende extrair o minério.

Pesa contra os investidores, ainda, segundo o ambientalista João Bosco Costa Lima - em matéria do Jornal Hoje em Dia -, que há casos até de ameaças aos atuais proprietários das terras em questão. "Moradores disseram que foram procurados e coagidos a vender suas terras ’porque o empreendimento vai sair de qualquer jeito". A Associação Mineira de Defesa do Ambiente - AMDA, em seu website afirma que o projeto prevê 23 transposições de rios sobre as quais a população não está informada.

E a coisa parece ser extremamente rentável pois, antes mesmo de ser implementado o complexo de exploração e transporte de minério, uma empresa estrangeira já adquiriu por US$ 1,15 bilhão (a metade do investimento previsto), grande participação no empreendimento. Já que falamos em cifras, vale lembrar que em seu RIMA (Relatório de Impacto Ambiental), os empreendedores declaram que "em troca" pelos danos cometidos (somente aqueles sob licenciamento, dada a imprevisibilidade dos ilegais e acidentais...), destinarão R$8 milhões (!) para projetos ambientais. Será que alguém, entre sociedade, meio ambiente e capital, não sairá perdendo nessa troca?

Que sejamos iluminados e corajosos para discutirmos de forma ampla, sem hipocrisia, todas as transposições (além das sangrias, pelos lençóis freáticos rebaixados, e a condenação à morte de nascentes e gente, pelas barragens de estéreis) a que o Brasil, e principalmente o estado de Minas Gerais, estão sendo submetidos pelo capital inescrupuloso e descomprometido com as questões do futuro! Em nome da vida - a que é e a que será!

Publicado originalmente em http://www.adital.com.br/