quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Nem tudo são más notícias neste mundo...


Depois de longa e involuntária ausência por envolvimento, nos últimos meses, com atividades que quase nunca me davam a oportunidade de acessar a rede, retorno com uma boa notícia para o meio ambiente. Espero que muitas outras surjam ao longo da caminhada. Tentarei ser mais assíduo, doravante...


Força, Paz e Luz!




14/10/2008 - Nova técnica russa de reciclagem de plástico gera gasolina pura


Cientistas russos da Universidade Medelevev em Moscou desenvolveram uma técnica de reciclagem que permite a produção de 1 litro de gasolina a partir de 1 quilo de sachês de plástico reciclado. O plástico e a gasolina são derivados do petróleo. Existem vários esforços ao redor do mundo, inclusive alguns já em operação comercial, tentando reciclar subprodutos do petróleo, mas este é o primeiro que gera gasolina pura. A tecnologia, desenvolvida pela equipe do Dr. Valery Shvets, é baseada no tratamento termal catalisado de materiais poliméricos. Os rejeitos plásticos devem ser simplesmente moídos e derretidos, sem necessidade de lavagem. A seguir é adicionado o catalisador em pó e a mistura é exposta à destruição termal, o que acontece em uma espécie de "panela de pressão" com temperatura e pressão definidas. Para cada litro de gasolina produzido o processo gera também uma pequena quantidade ("uma colher de mesa", segundo os pesquisadores) de uma substância viscosa densa, parecida com o piche. Como também é inflamável, esse rejeito também pode ser reaproveitado. Os pesquisadores não divulgaram detalhes sobre o composição do catalisador, já que é nele que está o segredo da descoberta, que está sendo patenteada. Um protótipo do sistema já está em funcionamento contínuo no laboratório da Universidade.


* Com informações do jornal Pravda de Moscou - Envolverde/Portal do Meio Ambiente

segunda-feira, 28 de julho de 2008

Parar a Roda... - Por Nísio Miranda

Com certo atraso - até porque quando a recebemos o Ecocidadania Ativa não existia - mas com a atualidade das mensagens que se perenizarão, tanto pela importância de quem as escreve, como pela convicção e a força do que dizem, segue postagem da Carta Circular 2008 de Dom Pedro Casaldáliga, que pela grandeza, luminosidade e generosidade, dispensa comentários.

Cantaremos gregoriano?

Paz e Bem!

Circular 2008 - “PARAR A RODA BLOQUEANDO SEUS RÁIOS” - Por Pedro Casaldáliga

Estava eu pensando a circular de 2008, quando me invade, como um rio bíblico de leite e mel, uma autêntica enchente de mensagens de solidariedade e carinho por ocasião dos meus 80 anos. Não podendo responder a cada um e a cada uma em particular, inclusive porque o irmão Parkinson tem os seus caprichos, peço a vocês que recebam esta circular como um abraço pessoal, entranhável, de gratidão e de comunhão renovadas.

Estou lendo uma biografia de Dietrich Bonhoeffer, intitulada, muito significativamente, Deveríamos ter gritado. Bonhoeffer, teólogo e pastor luterano, profeta e mártir, foi assassinado pelo nazismo, no dia 9 de abril de 1945, no campo de concentração de Flossenbürg. Ele denunciava a «Graça barata» à qual reduzimos muitas vezes nossa fé cristã. Advertia também que «quem não tenha gritado contra o nazismo não tem direito a cantar gregoriano». E chegava finalmente, já nas vésperas do seu martírio, a esta conclusão militante: «Tem que se parar a roda bloqueando seus raios». Não bastava então socorrer pontualmente as vítimas trituradas pelo sistema nazi, que para Bonhoeffer era a roda; e não nos podem bastar hoje o assistencialismo e as reformas-remendo frente a essa roda que para nos é o capitalismo neoliberal com os seus raios do mercado total, do lucro omnímodo, da macro-ditadura econômica e cultural, dos terrorismos do estado, do armamentismo de novo crescente, do fundamentalismo religioso, da devastação ecocida da terra, da água, da floresta e do ar.

Não podemos ficar estupefatos diante da iniqüidade estruturada, aceitando como fatalidade a desigualdade injusta entre pessoas e povos, a existência de um Primeiro Mundo que tem tudo e um Terceiro Mundo que morre de inanição. As estatísticas se multiplicam e vamos conhecendo mais números dramáticos, mais situações infra-humanas. Jean Ziegler, relator das Nações Unidas para a Alimentação, afirma, carregado de experiência, que «a ordem mundial é assassina, pois hoje a fome não é mais uma fatalidade». E afirma também que «destinar milhões de hectares para a produção de bio-carburantes é um crime contra a Humanidade». O bio-combustível não pode ser um festival de lucros irresponsáveis. A ONU vem alertando que o aquecimento global do planeta avança mais rapidamente do que se pensava e, a menos que se adotem medidas urgentes, provocará a desaparição do 30% das espécies animais e vegetais, milhões de pessoas serão privadas de água e proliferarão as secas, os incêndios, as enchentes. A gente se pergunta angustiado quem irá adotar essas «medidas urgentes».

O grande capital agrícola, com o agronegócio e cada vez mais o hidronegócio, avança sobre o campo, concentrando terra e renda, expulsando às famílias camponesas e jogando-as errantes, sem terra, acampadas, engrossando as periferias violentas das cidades. Dom Erwin Kräutler, bispo de Xingu e presidente do CIMI, denuncia que «o desenvolvimento na Amazônia tornou-se sinônimo de desmatar, queimar, arrasar, matar». Segundo Roberto Smeraldi, de Amigos da Terra, as políticas contraditórias do Banco Mundial por um lado «prometem salvar as árvores» e por outro lado, «ajudam a derrubar a Amazônia».

Mas a Utopia continua. Como diria Bloch, somos «criaturas esperançadas» (e esperançadoras). A esperança segue, como uma sede e como um manancial. «Contra toda esperança esperamos». Da esperança fala, precisamente, a recente encíclica de Bento XVI. (Pena que o Papa, nesta encíclica, não cita nem uma vez o Concílio Vaticano II, que nos deu a Constituição Pastoral Gaudium et Spes –Alegria e Esperança-. Seja dito de passagem, o Concílio Vaticano II continua amado, acusado, silenciado, preterido... Quem tem medo do Vaticano II?). Frente ao descrédito da política, em quase todo o mundo, nossa Agenda Latinoamericana 2008 aposta por uma nova política; até «pedimos, sonhando alto, que a política seja um exercício de amor». Um amor muito realista, militante, que subverta estruturas e instituições reacionárias, construídas com a fome e o sangue das maiorias pobres, ao serviço do condomínio mundial de uma minoria plutocrata.

Por sua parte as entidades e os projetos alternativos reagem tentando criar consciência, provocar uma santa rebeldia. O FSM 2009 vai-se realizar, precisamente, na Amazônia brasileira e terá a Amazônia como um dos seus temas centrais. E o XII Encontro Inter-eclesial das CEBs, em 2009, se celebrará também na Amazônia, em Porto Velho, Rondônia. Nossa militância política e nossa pastoral libertadora devem assumir cada vez mais estes desafios maiores, que ameaçam nosso Planeta. «Escolhemos, pois, a vida», como reza o lema da Campanha da Fraternidade 2008. O apóstolo Paulo, em sua Carta aos Romanos, nos lembra que «toda a criação geme e está com dores de parto» (Rom.8,22). Os gritos de morte cruzam-se com os gritos de vida, neste parto universal.

É tempo de paradigmas. Creio que hoje se devem citar, como paradigmas maiores e mais urgentes, os direitos humanos básicos, a ecologia, o diálogo inter-cultural e interreligioso e a convivência plural entre pessoas e povos. Estes quatro paradigmas nos afetam a todos, porque saem ao encontro das convulsões, objetivos e programas que está vivendo a Humanidade maltratada, mas esperançada ainda sempre.

Com tropeços e ambigüidades Nossa América se move para a esquerda; «novos ventos sopram no Continente»; estamos passando «da resistência à ofensiva». Os povos indígenas de Abya Yala têm saudado com alegria a Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas, que afeta a mais de 370 milhões de pessoas em 70 paises do Mundo; e reivindicarão a execução real dessa Declaração.

Nossa Igreja da América Latina e o Caribe, em Aparecida, se não foi aquele Pentecostes que queríamos sonhar, foi uma profunda experiência de encontro entre bispos e povo; e confirmou os traços mais característicos da Igreja da Libertação: o seguimento de Jesus, a Bíblia na vida, a opção pelos pobres, o testemunho dos mártires, as comunidades, a missão inculturada, o compromisso político.

Irmãos e irmãs, que raios vamos quebrar em nossa vida diária?, como ajudaremos a bloquear a roda fatal?, teremos direito a cantar gregoriano?, saberemos incorporar em nossas vidas esses quatro paradigmas maiores traduzindo-os em prática diária?

Recebam um abraço entranhável na esperança subversiva e na comunhão fraterna do Evangelho do Reino. Vamos sempre para a Vida.
Recebida em 07 de março de 2008.

quinta-feira, 24 de julho de 2008

RETALHO DE POESIA - Por Nísio Miranda



Louco por ver o que restou

da história - Felicidade

cidade perdida na memória.

Fazer o quê?

Um mês ausente! A cada dia chego mais à conclusão de que não nasci para ser "blogueiro". Mas continuarei insistindo, até que alcance a excelência de conseguir publicar todos os dias artigos meus e dos que falam a nossa linguagem. Enquanto isso não acontece, por pura falta de tempo e, talvez, de necessárias dedicação e abdicação de outras tarefas menos nobres, vou publicando - hoje sim, amanhã não - as pérolas de nossos pensadores prediletos. Como essa aí embaixo, do Leonardo Boff.

Até breve (se eu conseguir....)

Paz e Bem!

É possível ser feliz num mundo infeliz? - Por Leonardo Boff *


Adital – Brasil – 21/07/2008 - Não podemos calar a pergunta: como ser feliz num mundo infeliz? Mais da metade da população mundial é sofredora, vivendo abaixo do nível da pobreza. Há terremotos, tsunamis, furacões, inundações e secas.

No Brasil apenas 5 mil famílias detém 46% da riqueza nacional. No mundo 1125 bilionários individuais possuem riqueza igual ou superior à riqueza do conjunto de paises onde vivem 59% da humanidade. O aquecimento global evocou o fantasma de graves ameaças à estabilidade do planeta e ao futuro da humanidade. Diante deste quadro, é possível ser feliz? Só podemos ser felizes junto com outros.

Importa reconhecer que estas contradições não invalidam a busca da felicidade. Ela é permanente embora pouco encontrada. Isso nos obriga a fazer um discurso critico e não ingênuo sobre as chances de felicidade possível.

Na reflexão anterior sobre o mesmo tema, enfatizamos o fato de que a felicidade sustentável é somente aquela que nasce do caráter relacional do ser humano. Em seguida, é aquela que aprende a buscar a justa medida nas contradições da condição humana. Feliz é quem consegue acolher a vida assim como ela é, escrevendo certo por linhas tortas. Aprofundando a questão, cabe agora refletir sobre o que significa ser feliz e estar feliz. Foi Pedro Demo, a meu ver, uma das cabeças mais bem arrumadas da inteligência brasileira, que entre nós melhor estudou a "Dialética da Felicidade" (3 tomos, 2001). Ele distingue dois tempos da felicidade e nisso o acompanhamos: o tempo vertical e o tempo horizontal. O vertical é o momento intenso, extático e profundamente realizador: o primeiro encontro amoroso, ter passado num concurso difícil, o nascimento do primeiro filho. A pessoa está feliz. É um momento que incide, muito realizador, mas passageiro.

E há o momento horizontal: é o que se estende no dia a dia, como a rotina com suas limitações. Manejar sabiamente os limites, saber negociar com as contradições, tirar o melhor de cada situação: isso faz a pessoa ser feliz.

Talvez o casamento nos sirva de ilustração. Tudo começa com o enamoramento, a paixão e a idealização do amor eterno, o que leva a querer viver junto. É a experiência de estar feliz. Mas, com o passar do tempo, o amor intenso dá lugar à rotina e à reprodução de um mesmo tipo de relações com seu desgaste natural. Diante desta situação, normal numa relação a dois, deve-se aprender a dialogar, a tolerar, a renunciar e a cultivar a ternura sem a qual o amor se extenua até virar indiferença. É aqui que a pessoa pode ser feliz ou infeliz.
Para ser feliz na extensão temporal, precisa de invenção e de sabedoria prática. Invenção é a capacidade de romper a rotina: visitar um amigo, ir ao teatro, inventar um programa. Sabedoria prática é saber desproblematizar as questões, acolher os limites com leveza, saber rimar dor com amor. Se não fizer isso, vai ser infeliz pela vida afora.

Estar feliz é um momento. Ser feliz é a um estado prolongado. Este se prolonga porque sempre é recriado e alimentado. Alguém pode estar feliz sendo infeliz. Quer dizer, tem um momento intenso de felicidade (momento) como o reencontro com um irmão que escapou da morte. Como pode ser feliz (estado) sem estar feliz (momento), quer dizer, sem que algo lhe aconteça de arrebatador.

A felicidade participa de nossa incompletude. Nunca é plena e completa. Faço minha a brilhante metáfora de Pedro Demo: "a felicidade participa da lógica da flor: não há como separar sua beleza, de sua fragilidade e de seu fenecimento".

Teólogo, escritor e professor
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terça-feira, 24 de junho de 2008

João Guimarães Rosa: 27/06/2008 - Centenário de Nascimento







"Quando escrevo, repito o que já vivi antes. E para estas duas vidas, um léxico só não é suficiente. Em outras palavras, gostaria de ser um crocodilo vivendo no rio São Francisco. Gostaria de ser um crocodilo porque amo os grandes rios, pois são profundos como a alma de um homem. Na superfície são muito vivazes e claros, mas nas profundezas são tranqüilos e escuros como o sofrimento dos homens."

sexta-feira, 20 de junho de 2008

Morrer depois... Mário Quintana, para uma rápida catarse:


Sentir primeiro, pensar depois


Perdoar primeiro, julgar depois


Amar primeiro, educar depois

Esquecer primeiro, aprender depois

Libertar primeiro, ensinar depois

Alimentar primeiro, cantar depois

Possuir primeiro, contemplar depois

Agir primeiro, julgar depois

Navegar primeiro, aportar depois

Viver primeiro, morrer depois


Da difícil arte de se manter uma página atualizada - Por Nísio Miranda

Prezados (as) leitores (as),
Saúde e Paz!


Estou acometido de profunda frustração, que devem experimentar muitos daqueles que se aventuram na experiência da edição e publicação de um blog, neste vastíssimo mundo da rede mundial de computadores, na tentativa de (e na plena convicção de que conseguirá) cibernetizar as informações que detém, pretendendo contribuir para a construção de um mundo melhor, fraterno, justo, solidário e, conseqüentemente, sustentável, no sentido mais especial do termo para a Humanidade.
O mundo e suas múltiplas e hipersônicas transformações nos atropelam a todo instante, nossos afazeres profissionais nos limitam, nosso pouco tempo para o afeto familiar e amistoso nos cobra mais, nosso raciocínio e capacidade de processamento combalidos pelo milhão e meio de informações por minuto nos impele a atabalhoar o inadiável e esquecer ou desprezar o que não é tão urgente. E nossos blogues sofrem à deriva, por esta última atitude.
Entretanto, não pretendo parar. Seria ainda mais frustrante... Continuarei a postar os textos dos que admiramos e as idéias positivas e proativas que garimpamos aqui e acolá nas escrituras alheias. E por cá continuarão a desfilar impagáveis pepitas textuais - de um engajamento encorajador - gestadas por grandes homens e mulheres como Leonardo Boff, Maturana, Gilney Viana, Marina Silva, Henrique Cortez, Nilton Bonder, Almir Paraca, Pedro Casaldáliga, Frei Betto, Rubem Alves, e tantos outros que estarão, às vezes sem saber, construindo este espaço comigo e por mim, para que possamos cumprir nosso objetivo, inscrito na abertura da página.
De vez em quando, me manifestarei pessoalmente, sempre que o inexorável tempo voltar-se um pouco para mim, permitindo-me fazê-lo, certamente em detrimento de algumas outras atividades que necessariamente adiarei, sine die, para poder me dar esse inestimável prazer. 
Assim, hoje, trago em estréia no nosso espaço, um dos homens mais inteligentes de que tenho tido oportunidade de ler: Dr. Luiz Eduardo Cheida.
Médico, deputado estadual e presidente da Comissão de Ecologia e Meio Ambiente da Assembléia Legislativa do Paraná. Premiado pela ONU por seus projetos ambientais, foi prefeito de Londrina, secretário de Estado do Meio Ambiente, membro titular do CONAMA (Conselho Nacional do Meio Ambiente) e do Conselho Nacional de Recursos Hídricos.
Um seu texto que muito me impressionou, entre muitos outros que certamente, em breve, figurarão por aqui é o que segue.

Espero que gostem. Desculpando-me pela minha incapacidade blogueira e pelo desabafo por ela,
com um Ecofraterno abraço.

TOQUE DE RECOLHER - Por Luiz Eduardo Cheida


A velocidade é a nova pandemia que faz adoecer os humanos do século XXI.

Infectados pelos males da rapidez, também fazemos adoecer, no mundo natural, tudo aquilo que conseguimos tocar.

A sociedade do fast-food, em nome da rapidez, determina que o amadurecimento daquilo que nos alimenta seja mais curto. Encurtar o ciclo das frutas, abreviar o amadurecimento dos legumes, diminuir o tempo de vida dos animais que nos dão a carne, fenecer com avidez as verduras. Mexemos com a vida ao sabor de nosso apetite.

A sociedade de mercado determina que a produção de cereais seja maior. Há um campeonato a ser jogado, e no afã de chegar em primeiro, ganha aquele que aumentar mais a produção. Mas, nesse esporte o dopping é permitido.

Aceitam-se compostos químicos que, com suas moléculas high-tech, arrasam outras formas de vida. Para ter rapidez, eliminam-se competidores e predadores. Turbinar o concorrente com venenos, aqui, não é imoral, inda que isso custe o equilíbrio do local. Até porque, se duplicamos a safra, tudo se justifica. Afinal, o equilíbrio pretendido não é o ambiental e sim o da balança comercial.

Mexemos com a vida ao sabor de nossa ganância.

E assim, a vida gira, gira, gira. E o tempo passa, passa, passa. E a luz está acesa para que a galinha bote sem descanso. E os campos, revolvidos, produzindo o tempo todo. E a máquina, azeitada, repetindo movimentos por toda a eternidade...

Contrariamente ao frenesi humano, o resto da natureza segue seu curso. A uma estação sucede-se outra. De velocidade diferente.

O outono, que sucedeu o verão, já chegou. É a estação das grandes colheitas; dos dias e noites de mesma duração; é, como dizem, quando a seiva das plantas começa caminhar para a raiz, para o seu recolhimento.

O ciclo da vida comporta descanso. Nada na natureza é artificialmente contínuo como o homem dá a entender. A um período mais ativo, segue-se um período de descanso. A natureza descansa. As pessoas também deveriam se acalmar. Como a natureza, deveriam retirar a pressa.
Ao outono, sucede o inverno.

- É frio, hein padrinho?

Pois então, como a seiva, recolha-se. Ou sente-se e leia. Ou durma mais cedo. Recarregue-se... Assim, quando chegar a primavera, você volta para o sol e floresce de novo!

Não é bom correr tanto. Quem vive tudo agora, tem que antecipar o futuro. Gastando o futuro agora, fica-se sem ele para depois. Sem futuro para ir, nada mais fará sentido.

Para esta sociedade estressada, é preciso um toque de recolher.

De minha parte, na flor de meus 53 anos, assim expresso meu propósito:


Outonou meu
Verão
Os que viverem
Verão
Outro tom
Outro eu.

Luiz Eduardo Cheida é médico, deputado estadual e presidente da Comissão de Ecologia e Meio Ambiente da Assembléia Legislativa do Paraná. Premiado pela ONU por seus projetos ambientais, foi prefeito de Londrina, secretário de Estado do Meio Ambiente, membro titular do CONAMA (Conselho Nacional do Meio Ambiente) e do Conselho Nacional de Recursos Hídricos.

segunda-feira, 2 de junho de 2008

Agir rápido, agir juntos - Por Leonardo Boff *

Adital - Brasil - 02/05/2008 - Finalmente, também as Igrejas estão se mobilizando para enfrentar as mudanças climáticas da Terra. O secretário geral da ONU Ban Ki Moon visitou em março o Conselho Mundial das Igrejas em Genebra e disse: "um problema global exige uma reposta global: nós precisamos da ajuda das Igrejas". E elas responderam prontamente com uma conclamação aos milhões de cristãos dispersos pelo mundo afora com estas palavras: "agir rápido, agir juntos porque não temos tempo a perder". Citaram a Bíblia para enfatizar que Deus nos entregou a Terra como herança para administrar e não para dominar, pois esta palavra bíblica "dominar" significa cuidar e gerenciar. Acolheram os dois imperativos propostos pelo Painel Intergovernamental das Mudanças Climáticas (IPCC): a mitigação e a adaptação. A mitigação quer identificar as causas produtoras do aquecimento global que é o nosso estilo dilapidador de produção e consumo ilimitado e individualista. A adaptação considera os efeitos perversos, especialmente nos países mais vulneráveis do Sul do mundo que demandam solidariedade, pois se não conseguirem se adaptar, assistiremos estarrecidos, a grandes dizimações.

As Igrejas assumem uma função pedagógica: ao evangelizarem, devem propor o ideal de uma sobriedade voluntária e de uma austeridade jovial e ensinar o respeito a todos os seres, pois todos saíram do coração de Deus. Sendo dons do Criador, devem ser condivididos solidariamente entre todos a começar pelos que mais precisam.

A Igreja Católica oficialmente ainda não propôs nada de relevante. Mas a Conferência dos Bispos do Brasil em suas Campanhas da Fraternidade sobre a água e sobre a Amazônia ajudou a despertar uma consciência ecológica. Os bispos canadenses publicarem recentemente uma bela carta pastoral com o título: "a necessidade de uma conversão". Atribuem à conversão um significado que transcende seu sentido estritamente religioso. Ele implica "encontrar o sentido do limite, pois, um planeta limitado não pode responder a demandas ilimitadas". Precisamos, dizem, libertar-nos da obsessão consumista. "O egoísmo não é somente imoral, ele é suicida; desta vez não temos outra escolha senão uma nova solidariedade e novas formas de partilha".

Chegamos a esse ponto, reconhecem, porque há séculos não respeitamos mais as leis da vida, olvidando a sabedoria ancestral que ensinava: "não comandamos a natureza senão obedecendo a ela". É mais fácil enviar pessoas à lua e trazê-las de volta do que fazer com que os humanos respeitem os ritmos da natureza. Agora estamos colhendo os frutos envenenados da dessacralização da vida induzida pelo poder da tecno-ciência a serviço da acumulação de uns poucos.

A fé hebraico-cristã possui suas razões próprias para fundar um comportamento ecologicamente responsável. Parte da crença, semelhante àquela da moderna cosmologia, de que Deus transportou a criação do caos ao cosmos, quer dizer, de um universo marcado pela desordem a um outro no qual vige a ordem e a beleza. E Deus disse: "Isto é bom". Colocou o homem e a mulher no jardim do Éden para que o "cultivassem e o guardassem". "Cultivar" implica cuidar e favorecer o crescimento e "guardar" significa proteger e assegurar a continuidade dos recursos, como diríamos hoje, garantir um desenvolvimento sustentável.

Importa refazer a conexão rompida com a natureza para que possamos de novo gozar de sua beleza e confiar em seu futuro. Esta fé funda a esperança de que a criação possui um fim bom, tão finamente expresso no livro da Sabedoria: "Senhor, tu amas todos os seres e a todos poupas porque a ti pertencem, ó soberano amante da vida" (11, 24 e 26).
* Teólogo e professor emérito de ética da UERJ
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Mato Grosso foi responsável por 70% do desmatamento da Amazônia em abril, diz Inpe - Por Marco Antônio Soalheiro


Brasília - O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) informou nesta segunda-feira (2) que 1.123 quilômetros quadrados da Floresta Amazônica sofreram corte raso ou degradação progressiva durante o último mês de abril.Desse total, 794 quilômetros quadrados foram devastados somente no estado do Mato Grosso. Os dados foram colhidos pelo sistema Detecção do Desmatamento em Tempo Real (Deter).Em março, o mesmo sistema havia registrado destruição de 112 quilômetros quadrados de floresta no estado do Centro-Oeste, mas naquele mês 69% do Mato Grosso não pôde ser observado pelos satélites, por causa da presença de nuvens. Em abril, a visibilidade aumentou, pois apenas 14% do estado permaneceu encoberto. O Deter apura apenas desmatamentos com área maior que 25 hectares, por conta da resolução dos sensores espaciais. Entretanto, devido à cobertura de nuvens, nem todos os desmatamentos maiores que 25 hectares são identificados pelo sistema.(Envolverde/Agência Brasil)

© Copyleft - É livre a reprodução exclusivamente para fins não comerciais, desde que o autor e a fonte sejam citados e esta nota seja incluída. 02/06/2008 - 05h06 -

terça-feira, 20 de maio de 2008

Carlos Minc quer mudar lei para reduzir burocracia de licenciamentos ambientais - Por Redação da Agência Brasil


Brasília - O novo ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, defendeu nesta quita-feira (15), em Paris, a elaboração de uma nova lei de licenciamento ambiental para o Brasil, “com exigências mais rigorosas, mas que diminua ao mesmo tempo a burocracia". As informações são da BBC Brasil.Durante sua gestão como secretário estadual do Ambiente do Rio de Janeiro, Minc reduziu pela metade o tempo para aprovar certificações e licenças de instalação e operação no estado."Mais burocracia não significa maior rigor em relação às exigências ambientais", argumentou Minc, em entrevista coletiva na capital francesa. "Ao contrário, a burocracia é a mão da corrupção", afirmou.Minc disse que vai manter "todas as políticas da ex-ministra Marina Silva, sem exceções, e aprofundá-las em algumas questões", com base em sua experiência própria com políticas urbanas e industriais como secretário no Rio de Janeiro. O novo ministro disse que "foi obrigado" ao aceitar o cargo. "Não era convite, era intimação", afirmou. "Não pedi, tenho mandato no Parlamento [Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro], mas, em vista da insistência do governador Sérgio Cabral [do Rio de Janeiro], disse que aceitaria o cargo", completou. Entre as políticas defendidas pelo novo ministro está a ampliação das áreas protegidas no Brasil. "Sou preservacionista", afirmou. "As áreas protegidas no Brasil têm de ser ampliadas e cuidadas. E têm de ter financiamento para a sua preservação", defendeu.Minc disse ainda que pretende implantar em nível nacional um sistema de defesa das unidades protegidas utilizando profissionais formados especialmente para esta atividade, como já fez no Rio de Janeiro. Esse sistema poderia incluir o uso de militares nas áreas de conservação, segundo Minc. Na próxima segunda-feira (19), Carlos Minc se reunirá com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e com Marina Silva, em Brasília. (Envolverde/Agência Brasil)

© Copyleft - É livre a reprodução exclusivamente para fins não comerciais, desde que o autor e a fonte sejam citados e esta nota seja incluída.

segunda-feira, 19 de maio de 2008

QUERIDA MARINA - por Frei Betto


CAÍSTE DE pé! Trazes no sangue a efervescente biodiversidade da floresta amazônica. Teu coração desenha-se no formato do Acre e em teus ouvidos ressoa o grito de alerta de Chico Mendes. Corre em tuas veias o curso caudaloso dos rios ora ameaçados por aqueles que ignoram o teu valor e o significado de sustentabilidade.

Na Esplanada dos Ministérios, como ministra do Meio Ambiente, tu eras a Amazônia cabocla, indígena, mulher. Muitas vezes, ao ouvir tua voz clamar no deserto, me perguntei até quando agüentarias.

Não te merece um governo que se cerca de latifundiários e cúmplices do massacre de ianomâmis. Não te merecem aqueles que miram impassíveis os densos rolos de fumaça volatilizando a nossa floresta para abrir espaço ao gado, à soja, à cana, ao corte irresponsável de madeiras nobres.

Por que foste excluída do Plano Amazônia Sustentável? A quem beneficiará esse plano, aos ribeirinhos, aos povos indígenas, aos caiçaras, aos seringueiros ou às mineradoras, às hidrelétricas, às madeireiras e às empresas do agronegócio?

Quantas derrotas amargaste no governo? Lutaste ingloriamente para impedir a importação de pneus usados e a transformação do país em lixeira das nações metropolitanas; para evitar a aprovação dos transgênicos; para que se cumprisse a promessa histórica de reforma agrária.

Não te muniram de recursos necessários à execução do Plano de Ação para a Prevenção e Controle do Desmatamento da Amazônia Legal, aprovado pelo governo em 2004.

Entre 1990 e 2006, a área de cultivo de soja na Amazônia se expandiu ao ritmo médio de 18% ao ano. O rebanho se multiplicou 11% ao ano. Os satélites do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) detectaram, entre agosto e dezembro de 2007, a derrubada de 3.235 km2 de floresta.

É importante salientar que os satélites não contabilizam queimadas, apenas o corte raso de árvores. Portanto, nem dá para pôr a culpa na prolongada estiagem do segundo semestre de 2007. Como os satélites só captam cerca de 40% da área devastada, o próprio governo estima que 7.000 km2 tenham sido desmatados.

Mato Grosso é responsável por 53,7% do estrago; o Pará, por 17,8%; e Rondônia, por 16%. Do total de emissões de carbono do Brasil, 70% resultam de queimadas na Amazônia.

Quem será punido? Tudo indica que ninguém. A bancada ruralista no Congresso conta com cerca de 200 parlamentares, um terço dos membros da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.

E, em ano de eleições municipais, não há nenhum indício de que os governos federal e estaduais pretendam infligir qualquer punição aos donos das motosserras com poder de abater árvores e eleger ($) candidatos.

Tu eras, Marina, um estorvo àqueles que comemoram, jubilosos, a tua demissão, os agressores do meio ambiente, os mesmos que repudiam a proposta de proibir no Brasil o fabrico de placas de amianto e consideram que "índio atrapalha o progresso".

Defendeste com ousadia nossas florestas, nossos biomas e nossos ecossistemas, incomodando quem não raciocina senão em cifrões e lucros, de costas para os direitos das futuras gerações. Teus passos, Marina, foram sempre guiados pela ponderação e pela fé.

Em teu coração jamais encontrou abrigo a sede de poder, o apego a cargos, a bajulação aos poderosos, e tua bolsa não conhece o dinheiro escuso da corrupção.

Retorna à tua cadeira no Senado Federal. Lembra-te ali de teu colega Cícero, de quem estás separada por séculos, porém unida pela coerência ética, a justa indignação e o amor ao bem comum.

Cícero se esforçou para que Catilina admitisse seus graves erros: "É tempo, acredita-me, demudares essas disposições; desiste das chacinas e dos incêndios. Estás apanhado por todos os lados. Todos os teus planos são para nós mais claros que a luz do dia. Em que país do mundo estamos nós, afinal? Que governo é o nosso?"

Faz ressoar ali tudo que calaste como ministra. Não temas, Marina. As gerações futuras haverão de te agradecer e reconhecer o teu inestimável mérito.


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CARLOS ALBERTO LIBÂNIO CHRISTO, o Frei Betto, 63, frade dominicano, escritor e assessor de movimentos sociais, é autor de, entre outras obras, "A Obra do Artista Uma Visão Holística do Universo". Foi assessor especial da Presidência da República (2003-2004).

terça-feira, 13 de maio de 2008

SEMINÁRIO LEGISLATIVO MINAS DE MINAS - Encontro Regional de Paracatu

Local: Câmara Municipal – Praça JK, nº 449 - Centro
15 de maio (quinta-feira)

Uma das grandes questões a ser discutida em Paracatu é a tensão ecológica provocada pela proximidade da lavra de ouro com a zona urbana. O projeto de expansão da mina, que prevê a triplicação de sua capacidade de produção, tem gerado apreensões e calorosos debates entre a população. Uma das questões discutidas é o montante e a destinação dos recursos financeiros a serem aplicados pela mineradora como compensação ambiental dessa expansão. Pela legislação atual, esses recursos podem ser aplicados em outros municípios.A produção mineral da região Noroeste do Estado, centrada em Paracatu e Vazante, corresponde a 93% da produção mineral da região, somando em 2007 conjuntamente R$ 447 milhões de faturamento, R$ 6,6 milhões de arrecadação de CFEM e R$ 7,8 milhões de ICMS. Em Paracatu se produz ouro, minério de zinco, calcário e cascalho. Em Vazante há produção de zinco, calcário e cascalho. No Estado, Paracatu é o único produtor de minério de chumbo, o 2º maior produtor de ouro e o 11º arrecadador da CFEM. Vazante é o maior produtor de minério de zinco e o 16º arrecadador da CFEM do Estado.Há também produção de fosfato em Lagamar e Patos de Minas (no Alto Paranaíba), cujo valor da produção atingiu R$ 21 milhões e gerou R$ 384 mil de CFEM em 2007, e atividade extrativa mineral em Varjão de Minas (calcário), Lagoa Grande (argila e areia), Unaí (calcário), Brasilândia de Minas (areia), Guarda-Mor (argila refratária) e João Pinheiro (areia). Nos dez municípios mobilizados para participarem do Encontro de Paracatu, existem 42 concessões de lavra e 91 registros de licença (estes últimos concedidos apenas para minérios utilizados diretamente na construção civil ou como corretivo de solos), totalizando 133 títulos que autorizam a extração mineral.

8h – Credenciamento
8h30 – ABERTURADeputado Alberto Pinto Coelho – Presidente da Assembléia Legislativa do Estado de Minas GeraisVasco Praça Filho – Prefeito MunicipalJosé Maria Andrade Porto – Presidente da Câmara Municipal
Palestras
9h30 – A mineração no contexto estadualConsultor da Assembléia Legislativa
9h45 – A mineração no contexto regional
José Eduardo Vargas – Superintendente da Superintendência Regional do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável do Noroeste de Minas (Supramnor)
Mauro da Fonseca Ellovitch – Promotor de Defesa do Meio Ambiente e Coordenador de Defesa do Meio Ambiente da Bacia do São Francisco
Victor Hugo Souza Belo – Diretor-Geral da Rio Paracatu Mineração S/AJosé Osvaldo Rosa de Souza – Diretor do Departamento Mineral da Federação dos Trabalhadores nas Indústrias Extrativas do Estado de Minas Gerais (Ftiemg) e Presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Indústria Extrativa de Paracatu
Antônio Eustáquio Vieira – Presidente da ONG Movimento Verde

10h30 - Grupos de trabalho

Grupo 1 A Sustentabilidade da Mineração em Minas GeraisGestão Ambiental e Mineração

Grupo 2 Sistema Federativo e a Legislação sobre Mineração – Política Tributária e MineraçãoPerspectivas do Setor Mineral – Cenários e Estratégias de Sustentabilidade para o Desenvolvimento Mineral e Conhecimento do Potencial Mineral

14h – Reinício do trabalho dos grupos

15h30 – Plenária finalApresentação do relatório dos grupos de trabalhoEleição dos 12 delegados representantes da região para a etapa final do seminário

17h – Encerramento

sexta-feira, 9 de maio de 2008

A III CONFERÊNCIA DE MEIO AMBIENTE E A POLÍTICA NACIONAL SOBRE MUDANÇAS CLIMÁTICAS - Por Gilney Viana


A III Conferência Nacional de Meio Ambiente, é o maior evento ambientalista do Brasil. Juntamente com as duas anteriores, constitui importante contribuição para a formação de um ambientalismo de massa no país ao reunir mais de 100.000 pessoas em suas sucessivas etapas. Esta grandiosidade deve trabalhar no sentido positivo de superar as dificuldades de diálogo com o segmento empresarial e as pequenas querelas dos burocratas de plantão.

A III Conferência por decisão do MMA se concentra no tema de Mudanças Climáticas. Aqui encerra a sua potência e a sua limitação. Potência por concentrar as discussões e resoluções da III Conferência em um tema central da conjuntura nacional e internacional. Limitação, ao propor a discussão do tema em seu “Caderno de Debate”, sem uma análise nem uma visão crítica do modelo de desenvolvimento econômico, social e ambiental dominante no país; e ao mesmo tempo sem um liame que dê consistência sistêmica às diversas propostas parciais.

Um exemplo. No Eixo Temático I. Florestas. Na apresentação do tema, destaca-se a participação de 75% dos desmatamentos e queimadas no total de emissões de CO2 do país e corretamente enumera uma série de propostas a começar por “perseguir o desmatamento ilegal zero nos biomas brasileiros”. Em contrapartida apresenta o sucesso do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia ao reduzir as elevadas taxas anuais de desmatamento. Sem contextualizar historicamente. Sem considerar as assimetrias da economia brasileira que levam a Amazônia Legal crescer mais do que o restante do país, seja no período de estagnação (décadas de 1980 e 1990) seja na atual fase de crescimento; embora nessa fase de capitalismo globalizado deva responder mais ativamente aos estímulos do mercado. A participação relativa da região no PIB do país cresceu de 5,27% em 1985 para 6,43% em 1995 e 7,90 em 2005; e seu rebanho bovino deu saltos de 14,65% em 1985 para 23,27% em 1996 e 33,23% em 2006, em relação ao rebanho bovino nacional. Só para ficar no principal responsável pelo desmatamento; mas há a soja e toda a agropecuária convencional.

A questão central: esta é a inserção da Amazônia Legal no atual (e anterior) modelo de desenvolvimento do país? Este é o modelo de desenvolvimento que queremos? Sobre uma coisa e outra não há uma abordagem sistêmica no texto em discussão; bem diferente do que propõe o antigo texto do PAS – Programa Amazônia Sustentável.

Esta forma de propor o debate se distancia do enfoque dos Relatórios do IPCC, cuja credibilidade é suportada por três razões básicas: uma crítica ambiental consistente, com medições e previsões da elevação da temperatura média da Terra e seus possíveis impactos; a identificação da contribuição da ação humana, ou seja, do modo como se produz e consome e se relaciona com o meio ambiente; e finalmente, uma estratégia global para enfrentar o problema com propostas de metas de estabilização dos gases do efeito estufa e previsão de custos segundo alguns cenários de crescimento econômico.

Está certo o companheiro Hamilton Pereira, Secretário de Articulação Institucional do Ministério do Meio Ambiente, em artigo no site do PT, datado em 02052008: “Nos seis anos do governo Lula o Brasil enfrentou com relativo êxito esse triplo desafio: crescemos com democracia. É inegável. Crescemos com distribuição de renda. Na verdade, invertemos a máxima do ex-ministro Delfim Neto “crescer para distribuir”. Hoje, podemos dizer: “o Brasil distribui para crescer”. Todavia, não incorporamos a dimensão da sustentabilidade socioambiental à cultura do novo ciclo de desenvolvimento.”

O enfoque inicial da III Conferência é o inverso: a sustentabilidade socioambiental embasa todas as propostas do “Caderno de Debates” sem, contudo, propor a incorporação dessa dimensão ao novo ciclo de desenvolvimento.

Esta é a questão central: por mais válidas e necessárias que possam ser as políticas e os programas específicos, e por melhor que sejam os seus resultados, o sucesso da Política Nacional de Mudanças Climáticas depende em última instância de quanto conseguiremos incorporar sistemicamente a dimensão socioambiental no processo de desenvolvimento e fixação de metas a serem alcançadas a um determinado custo.
E isto depende da atuação da sociedade civil, do empresariado e do governo trabalhando numa mesma direção. Como diz o IPCC, envolve metas e custos para alcançá-las, que, digo eu, devem ser adequadamente distribuídos, para que os trabalhadores e os mais pobres da sociedade não sejam duplamente penalizados, pela injustiça ambiental vigente e pela injustiça de arcar com os ônus para mitigar ou superá-la; o que, espero, será considerado pela III Conferência de Meio Ambiente.

segunda-feira, 5 de maio de 2008

FRASE de DESTAQUE

Desenvolvimento Sustentável - Por Henrique Cortez *
“Compreendemos desenvolvimento sustentável como sendo socialmente justo, economicamente inclusivo e ambientalmente responsável. Se não for assim não é sustentável. Aliás, também não é desenvolvimento. É apenas um processo exploratório, irresponsável e ganancioso, que atende a uma minoria poderosa, rica e politicamente influente.”
Henrique Cortez é coordenador do "ECODEBATE" (www.ecodebate.com.br) e subeditor da Revista Cidadania e Meio Ambiente

quarta-feira, 30 de abril de 2008

CONSUMO SOLIDÁRIO E RESPONSÁVEL



O consumismo que a cultura do capital gestou está na base da fome de bilhões de pessoas e da atual falta de alimentos da humanidade

Por Leonardo Boff

Em primeiro lugar o consumo deve ser adequado à natureza do ser humano. Esta, por um lado, é material, enraizada na natureza e precisamos de bens materiais para subsistir. Por outro lado, é espiritual que se alimenta com bens intangíveis como a solidariedade, o amor, a acolhida e a abertura ao Infinito. Se estas duas dimensões não forem atendidas nos tornaremos anêmicos no corpo e no espírito. Em segundo lugar, o consumo precisa ser justo e equitativo. A Declaração dos Direitos Humanos afirma que a alimentação é uma necessidade vital e por isso um direito fundamental de cada pessoa humana (justiça) e conforme as singularidades de cada um (equidade). Não atendido este direito, a pessoa se confronta diretamente com a morte.

Em terceiro lugar, o consumo deve ser solidário. É solidário aquele consumo que supera o individualismo e se auto-limita por causa do amor e da compaixão para com aqueles que não podem consumir o necessário. A solidariedade se expressa pela partilha, pela participação e pelo apoio aos movimentos que buscam os meios de vida, como terra, moradia e saúde. Implica também a disposição de sofrer e de correr riscos que tal solidariedade comporta.

Em quarto lugar, o consumo há de ser responsável. É responsável o consumidor que se dá conta das conseqüências do padrão de consumo que pratica, se suficiente e decente ou sofisticado e suntuoso. Consome o que precisa ou disperdiça aquilo que vai faltar na mesa dos outros. A responsabilidade se traduz por um estilo sóbrio, capaz de renunciar não por acetismo mas por amor e em solidariedade para com os que sofrem necessidades. Trata-se de uma opção pela simplicidade voluntária e por um padrão conscientemente contido, que não se submete aos reclamos do desejo nem às solicitações da propaganda. Mesmo que não tenha consequências imediatas e visíveis, esta atitude vale por ela mesma. Mostra uma convicção que não se mede pelos efeitos esperados mas pelo valor que esta atitude humana possui em si mesma.

Por fim, o consumo deve ser realizador da integralidade do ser humano. Este tem necessidade de conhecimento e então consumimos os muitos saberes com o discernimento sobre qual deles convém e edifica. Temos necessidade de comunicação e de relacionamentos e satisfazemos esta necessidade alimentando relações pessoais e sociais que nos permitem dar e receber e nesta troca nos complementamos e crescermos. Às vezes esta comunicação se realiza participando de manifestações em favor da justiça, da reforma agrária, do cuidado pela água potável, da preservação da natureza, ou também vendo um filme, assistindo a um concerto, indo a um teatro, visitando uma exposição artística, participando de algum debate. Temos necessidade de amar e de sermos amados. Satisfazemos esta necessidade amando com gratuidade as pessoas e os diferentes de nós. Temos necessidade de transcendência, de ousarmos e de estarmos para além de qualquer limite imposto, de mergulharmos em Deus com quem podemos comungar. Todas estas formas de consumo realizam a existência humana em suas múltiplas dimensões.

Estas formas de consumo não custam e não gastam energia, pressupõem apenas o empenho e a abertura para a solidariedade, para a compaixão e para a beleza.

Tudo isso não traduz aquilo que pensamos quando falamos em felicidade?


Publicado originalmente em www.brasildefato.com.br em 28/04/2008

Foto: Nísio Miranda - Encontro da Comissão Especial da Fruticultura Mineira - ALMG -
Pirapora - MG em 01/09/2003

terça-feira, 29 de abril de 2008

SEMINÁRIO MINAS DE MINAS na (minha) Cidade dos Profetas












Congonhas receberá, em 08/05, a etapa de interiorização do Seminário Legislativo Minas de Minas, promovido pela Assembléia de Minas, do qual já falamos aqui.




Participe! É o seu futuro que está em jogo!



























Considero esta uma das mais importantes reuniões do Seminário, por tratar-se de um município que tem privilegiado a mineração como fonte de geração de emprego e renda, permitindo a exploração de suas jazidas à exaustão. A cidade tem tudo para ser um pólo turístico e de lazer, com suas atrações barrocas e paisagens exuberantes, além do famoso e bem estruturado Parque da Cachoeira.

O Jubileu do Bom Jesus do Matozinhos atrai milhares de fiéis todos os anos, há mais de duzentos anos, ao Município, o que, por si só, já se constitui num evento de propagação da exuberância da arte pela força da fé.

Não conseguimos compreender o porquê de, ainda assim, todos os seus gestores públicos, desde a sua emancipação política, nunca se empenharem em transformar essa vocação de atração por inúmeros atributos em realidade, para o bem da população e da sustentabilidade socioambiental da região.

Pouca gente sabe que as montanhas circundantes do núcleo urbano da cidade compõem o complexo paisagístico que se integra, que comunga com o conjunto arquitetônico criado pelo Mestre Antônio Francisco Lisboa, o "Aleijadinho", formando um belíssimo quadro. Entretanto, isso não impediu que a Companhia que explora a Mina Casa de Pedra rasgasse toda a extensão lateral da serra de mesmo nome, deixando uma ferida aberta de frente para as obras do Aleijadinho. O que é pior: segundo trabalhadores da própria companhia, a montanha desaparecerá em alguns anos.
Veja abaixo um quadro apresentado no site do próprio Município sobre a sua economia:
ECONOMIA

Congonhas está entre as quinze cidades que mais arrecada impostos em Minas Gerais. A principal origem destes impostos é o ICMS gerado pela empresas de extração de minério de ferro e pela Açominas. Já foi a primeira cidade em renda per-capita entre os mais de 700 municípios do Estado.

Mineração Casa de Pedra (CSN) Pertencente à
Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), até pouco tempo era responsável por 100% do minério de ferro consumido na siderúrgica em Volta Redonda. Já teve cerca de 1500 trabalhadores, hoje cerca de 600 funcionários e é uma das empresas mais tradicionais da região.

Ferteco Mineração S/A - A Ferteco Mineração S/A, era uma multinacional alemã, hoje pertencente à CVRD - Vale. Produz minério de ótima qualidade. Já teve quase 2000 funcionários e hoje tem cerca de 700 funcionários. Sua produção é destinada à exportação.


Ou seja, a tendência é que o número de empregados diminua ainda mais, com a utilização de novas tecnologias e até com a diminuição da própria capacidade de produção da jazida. Os lucros? Só AUMENTAM! Batem recordes a cada novo balanço. E a cidade?
Após a safra única do minério de ferro da região, como dito acima, "destinada à exportação", sem agregação de valor à matéria-prima, o que farão os habitantes de Congonhas? Viverão de quê?
Com a imensurável degradação do solo e a (in)consequente explotação dos recursos hídricos e minerais, pelo rebaixamento dos lençóis freáticos, pela supressão da vegetação nativa, o futuro que se desenha para a região não é dos mais promissores. 

A população tem que participar, dar suas sugestões, cobrar dos governantes uma posição de vanguarda quanto à diversificação econômica, à profícua utilização dos recursos da CFEM e ao aumento de sua alíquota arrecadada; à criação de novos espaços e fronteiras profissionais, à preservação do patrimônio ambiental, arquitetônico, paisagístico e cultural, sem as quais Congonhas e inúmeros outros municípios mineradores de Minas Gerais e do País tendem a tornar-se futuras cidades-fantasmas, desertas e sem vida.
As fotos do Parque da Cachoeira (piscina) e dos Profetas com o pôr-do-sol mostram ao fundo parte da montanha que irá desaparecer.

quinta-feira, 24 de abril de 2008

SEMINÁRIO MINAS DE MINAS - Mais etapas de interiorização

E quando as minas se exaurirem?!...




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A participação de todos é muito importante!

Divinópolis e Itaúna discutem cadeia produtiva da mineração

Divinópolis e Itaúna, no Centro-Oeste mineiro, recebem a terceira e quarta etapas de interiorização do Seminário Legislativo Minas de Minas da Assembléia Legislativa de Minas Gerais, nos dias 28 e 29 próximos, respectivamente. Em Divinópolis, o seminário se realiza na Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg), à rua Engenheiro Benjamim de Oliveira, 144-A - Esplanada, a partir de 8h30; e em Itaúna no Centro de Desenvolvimento Empresarial, à rua Capitão Vicente, 129, Centro. Na primeira, os debates vão se concentrar na mineração em áreas cársticas (calcário), consideradas de interesse ambiental. E na segunda, o destaque fica por conta das fundições de ferro, concentrando produção e perspectivas de investimento.

O Seminário Legislativo Minas de Minas é realizado pela ALMG, e conta com a parceria de entidades do setor produtivo, ambientalistas, trabalhadores e órgãos públicos. O objetivo é discutir a cadeia produtiva da mineração para elaborar uma política minerária estadual e colher sugestões para aprimorar a política nacional. Depois de 11 encontros regionais em abril e maio, acontece a etapa final em Belo Horizonte, de 9 a 12 de junho.

A 115 quilômetros de Belo Horizonte, com uma população de 205 mil de habitantes, Divinópolis terá como um dos palestrantes, a superintendente regional da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, no Alto São Francisco, Maria Cláudia Pinto. Ela destaca como preocupação principal da região a mineração em áreas cársticas, "que além do afloramento mineral do calcário e granito, guardam importantes sítios espeleológicos e arqueológicos, sobretudo em Arcos e Pains". Ela informa ainda que tais áreas são alvo de irregularidades, como a mineração clandestina e o uso de explosivos indiscriminadamente.Etapas - O calendário de encontros regionais do Seminário Legislativo Minas de Minas é: Itabira (23/4); Poços de Caldas (25/4); Divinópolis (28/4), Itaúna (29/4); Sete Lagoas (6/5); Congonhas (8/5); Araxá (13/5); Paracatu (15/5); Muriaé (20/5); Teófilo Otoni (27/5); e Governador Valadares (29/5).

Royalties da mineração - As cidades mineradoras da região, 26, foram responsáveis por um recolhimento da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (Cfem), de cerca de R$ 370 milhões no ano passado, retornando para a região um percentual de R$ 6 milhões. Divinópolis recolheu R$ 8 milhões e recebeu R$ 51 mil. Itaúna recolheu cerca de R$ 21 milhões e recebeu R$ 312 mil.

Itaúna, a 79 quilômetros de Belo Horizonte, com uma população de mais de 85 mil habitantes, tem na indústria o carro-chefe de sua economia, com destaque para a siderurgia de aço e ferro-gusa. Na área de metalurgia básica há nove fundições, e nas áreas de extração de minerais metálicos e não-metálicos existem três empresas. A cidade conta com reservas de argila e ferro, de acordo com relatório do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM). A cidade é a terceira a ter um escritório da Associação Brasileira de Fundição (Abifa) e também a contar com a Escola de Fundição Marcelino Corradi, do Senai.

Em Divinópolis o seminário será aberto pelo presidente da ALMG, deputado Alberto Pinto Coelho (PP), pelo prefeito da cidade, Demétrius Arantes Pereira e pelo presidente da Câmara Municipal, vereador Marcos Vinícius Alves da Silva. Em seguida, acontecem palestras sobre contexto regional da mineração, com a superintendente Regional de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável do Alto São Francisco, Maria Cláudia Pinto; o membro do Conselho da Unidade Regional do Colegiado do Alto São Francisco, representando a Associação Brasileira de Engenharia Sanitária - (ABES), Francisco de Assis Braga; e o vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), Edwaldo Almada de Abreu. Depois, acontecem discussões em grupos de trabalhos, sobre legislação, sustentabilidade, gestão ambiental e perspectivas do setor.

Responsável pela informação: Assessoria de Comunicação - ALMG - 31 - 2108 7715

quarta-feira, 23 de abril de 2008

"A UTOPIA É O QUE IMPEDE O ABSURDO DE TOMAR CONTA DA HISTÓRIA." por Leonardo Boff)

O pensamento de Eduardo Galeano e Leonardo Boff, em dois artigos recebidos através do excelente boletim da Agência Envolverde - Revista Digital de Meio Ambiente e Desenvolvimento

A NATUREZA NÃO É MUDA - Por Eduardo Galeano*




O Equador está discutindo uma nova Constituição. Entre as propostas, abre-se a possibilidade de reconhecer, pela primeira vez na história, os direitos da natureza. Parece loucura querer que a natureza tenha direitos. Em compensação, parece normal que as grandes empresas dos EUA desfrutem de direitos humanos, conforme foi aprovado pela Suprema Corte, em 1886.

O mundo pinta naturezas mortas, sucumbem os bosques naturais, derretem os pólos, o ar torna-se irrespirável e a água imprestável, plastificam-se as flores e a comida, e o céu e a terra ficam completamente loucos.

E, enquanto tudo isto acontece, um país latino-americano, o Equador, está discutindo uma nova Constituição. E nessa Constituição abre-se a possibilidade de reconhecer, pela primeira vez na história universal, os direitos da natureza.

A natureza tem muito a dizer, e já vai sendo hora de que nós, seus filhos, paremos de nos fingir de surdos. E talvez até Deus escute o chamado que soa saindo deste país andino, e acrescente o décimo primeiro mandamento, que ele esqueceu nas instruções que nos deu lá do monte Sinai: "Amarás a natureza, da qual fazes parte".

Um objeto que quer ser sujeito

Durante milhares de anos, quase todo o mundo teve direito de não ter direitos.
Nos fatos, não são poucos os que continuam sem direitos, mas pelo menos se reconhece, agora, o direito a tê-los; e isso é bastante mais do que um gesto de caridade dos senhores do mundo para consolo dos seus servos.

E a natureza? De certo modo, pode-se dizer que os direitos humanos abrangem a natureza, porque ela não é um cartão postal para ser olhado desde fora; mas bem sabe a natureza que até as melhores leis humanas tratam-na como objeto de propriedade, e nunca como sujeito de direito.

Reduzida a uma mera fonte de recursos naturais e bons negócios, ela pode ser legalmente maltratada, e até exterminada, sem que suas queixas sejam escutadas e sem que as normas jurídicas impeçam a impunidade dos criminosos. No máximo, no melhor dos casos, são as vítimas humanas que podem exigir uma indenização mais ou menos simbólica, e isso sempre depois que o mal já foi feito, mas as leis não evitam nem detêm os atentados contra a terra, a água ou o ar.

Parece estranho, não é? Isto de que a natureza tenha direitos... Uma loucura. Como se a natureza fosse pessoa! Em compensação, parece muito normal que as grandes empresas dos Estados Unidos desfrutem de direitos humanos. Em 1886, a Suprema Corte dos Estados Unidos, modelo da justiça universal, estendeu os direitos humanos às corporações privadas. A lei reconheceu para elas os mesmos direitos das pessoas: direito à vida, à livre expressão, à privacidade e a todo o resto, como se as empresas respirassem. Mais de 120 anos já se passaram e assim continua sendo. Ninguém fica estranhado com isso.

Gritos e sussurros

Nada há de estranho, nem de anormal, o projeto que quer incorporar os direitos da natureza à nova Constituição do Equador.

Este país sofreu numerosas devastações ao longo da sua história. Para citar apenas um exemplo, durante mais de um quarto de século, até 1992, a empresa petroleira Texaco vomitou impunemente 18 bilhões de galões de veneno sobre terras, rios e pessoas. Uma vez cumprida esta obra de beneficência na Amazônia equatoriana, a empresa nascida no Texas celebrou seu casamento com a Standard Oil. Nessa época, a Standard Oil, de Rockefeller, havia passado a se chamar Chevron e era dirigida por Condoleezza Rice. Depois, um oleoduto transportou Condoleezza até a Casa Branca, enquanto a família Chevron-Texaco continuava contaminando o mundo.

Mas as feridas abertas no corpo do Equador pela Texaco e outras empresas não são a única fonte de inspiração desta grande novidade jurídica que se tenta levar adiante. Além disso, e não é o menos importante, a reivindicação da natureza faz parte de um processo de recuperação das mais antigas tradições do Equador e de toda a América. Visa a que o Estado reconheça e garanta o direito de manter e regenerar os ciclos vitais naturais, e não é por acaso que a Assembléia Constituinte começou por identificar seus objetivos de renascimento nacional com o ideal de vida do sumak kausai. Isso significa, em língua quechua, vida harmoniosa: harmonia entre nós e harmonia com a natureza, que nos gera, nos alimenta e nos abriga e que tem vida própria, e valores próprios, para além de nós.

Essas tradições continuam miraculosamente vivas, apesar da pesada herança do racismo, que no Equador, como em toda a América, continua mutilando a realidade e a memória. E não são patrimônio apenas da sua numerosa população indígena, que soube perpetuá-las ao longo de cinco séculos de proibição e desprezo. Pertencem a todo o país, e ao mundo inteiro, estas vozes do passado que ajudam a adivinhar outro futuro possível.

Desde que a espada e a cruz desembarcaram em terras americanas, a conquista européia castigou a adoração da natureza, que era pecado de idolatria, com penas de açoite, forca ou fogo. A comunhão entre a natureza e o povo, costume pagão, foi abolida em nome de Deus e depois em nome da civilização. Em toda a América, e no mundo, continuamos pagando as conseqüências desse divorcio obrigatório.

* Publicado originalmente no semanário Brecha, do Uruguai. Tradução: Naila Freitas / Verso Tradutores

Recebido da Agência Envolverde (Texto e Imagem)

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EDUCAÇÃO ECO-CENTRADA - Por Leonardo Boff*

Há duas portas de entrada para a educação e para a socialização da vida humana: a família e a escola. Da família herdamos ou não o sentido da acolhida e da auto-confiança (da mãe) e o sentido dos limites e a percepção de valores éticos (do pai). A escola, alem que repassar informações, se propõe o objetivo de criar as condições para a formação de pessoas autônomas com competência para plasmar o próprio destino e aprender a conviver como cidadãos participativos. A educação, nesta perspetiva, era centrada no ser humano e na sociedade.

Esse propósito correto é hoje insuficiente. Depois que irrompeu o paradigma ecológico, nos conscientizamos do fato de que todos somos ecodependentes. Não podemos viver sem o meio-ambiente, com seus ecossistemas, que incluído o ser humano, forma o ambiente inteiro. Somos um elo da comunidade biótica. A humanidade não está frente à natureza, nem acima dela como donos mas dentro dela como parte integrante e essencial. Participamos de uma comunidade de interesses com os demais seres vivos que conosco compartem a biosfera. O interesse comum básico é manter as condições para a continuidade da vida e da própria Terra, tida como superorganismo vivo, Gaia.

O fato novo, até ha pouco ausente na consciência coletiva da grande maioria e também de cientistas, é que todo o sistema de vida está correndo risco. É conseqüência de uma civilização produtivista/consumista/materialista que tem predominado nos últimos séculos, hoje globalizada. Ela fez com que a Terra perdesse seu frágil equilíbrio e sua capacidade de autoregeneração. Temos que impedir que Gaia entre num processo de caos, buscando através dele um novo equilíbrio, mas à custa de pesados sacrifícios ecológicos como a dizimação de milhares de espécies, cataclismos, secas, inundações, insegurança alimentar em vastas proporções e, eventualmente, o desaparecimento de incalculável número de seres humanos.
A partir de agora a educação deve impreterivelmente incluir as quatro grandes tendências da ecologia: a ambiental, a social, a mental e a integral ou profunda (aquela que discute nosso lugar na natureza e nossa inserção na complexa teia das energias cósmicas). Mais e mais se impõem entre os educadores ambientais esta perpectiva: educar para a arte de viver em harmonia com a natureza e propor-se repartir equitativamente aos demas seres, os recursos da cultura e do desenvolvimento sustentável.

Precisamos estar conscientes de que não se trata apenas de introduzir corretivos ao sistema que criou a atual crise ecológica mas de educar para sua transformação. Isto implica superar a visão reducionista e mecanicista ainda imperante e assumir a cultura da complexidade. Ela nos permite ver as interrelações do mundo vivo e as ecodependências do ser humano. Tal verificação exige tratar as questões ambientais de forma global e integrada.

Deste tipo de educação se deriva a dimensão ética de responsabilidade e de cuidado pelo futuro comum da Terra e da humanidade. Faz descobrir o ser humano como o cuidador do jardim do Éden que é nossa Casa Comum e o guardião de todos seres. A democracia além de ser sem fim como o quer com razão Boaventura de Souza Santos, será também uma democracia sócio-ecológica. Junto com a cidadania (que vem de cidade) estará a florestania( que vem de floresta), ensaiada pelo governo petista do Acre. Ser humano e natureza se pertencem mutuamente e juntos devem construir um caminho de convivência não destrutiva.

Leonardo Boff é teólogo, escritor, professor emérito de ética da UERJ e membro da Comissão da Carta da Terra.

Publicado originalmente em http://envolverde.ig.com.br em 07/04/2008 - 11h04

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terça-feira, 22 de abril de 2008

Seminário Legislativo : MEIO AMBIENTE, MINERAÇÃO E SOCIEDADE






Democracia Participativa: instrumento de mudanças e reestruturação.

Faça parte desse processo! Ajude a decidir nosso futuro!


A Assembléia Legislativa de Minas Gerais lança hoje (22) Seminário Minas de Minas

A Assembléia lança hoje (22), às 15h30, no Salão Nobre, o
Seminário Legislativo Minas de Minas, que discutirá os amplos aspectos da cadeia produtiva da mineração no Estado. O objetivo é buscar subsídios para elaborar uma política minerária estadual orientada para a sustentabilidade e para aprimorar a política nacional. Participam representantes de empresários, trabalhadores, acadêmicos e da sociedade civil. A primeira fase, de interiorização, começa amanhã (23), em Itabira, e se estende por outras dez cidades, com palestras de especialistas, debates e discussões em grupos. Todas as sugestões serão consolidadas na etapa final, entre os dias 9 e 12 de junho, no Plenário, em Belo Horizonte. Leia mais

NÃO VERÁS PAÍS NENHUM - Mais uma pelo Dia do Planeta Terra, por Nísio Miranda











Prezados (as) Eco-cidadãos,
Saúde e Paz!

Às vezes me perguntam onde e quando comecei a me preocupar com a preservação da Natureza. Nas andanças pelas audiências públicas, nos encontros ambientalistas, entre uma conferência do meio ambiente, um seminário, um ciclo de debates e outros eventos, me perguntam porque, quais as razões me levaram a abraçar a causa e outras curiosidades que as pessoas têm, principalmente num mundo em que se faz quase tudo por "modismos" ou "ondas". Confesso que não me lembro, a não ser no que me remete às atitudes primordiais mais simples, como guardar um papel no bolso para depois jogá-lo no lixo, e não na rua; não lançar nada nos córregos e rios, nem em bueiros; não desperdiçar água; não provocar incêndios nas matas; em minhas incursões pela natureza, deixá-la como eu a encontrar, dentre outras. Estes foram tópicos constantes no variado temário do nosso processo educativo, encabeçado pelo meu pai, um intelectual (de grandiosa humildade, mesmo sabendo tudo o que sabia) visionário e idealista; e minha mãe, educadora - na essência mais profunda da palavra - por uma vida inteira; além do convívio com uma família pródiga na multiplicação de educadores e estudiosos de tudo, além de uma rápida passagem pelo universo do escotismo.

O que sei é que a leitura deste livro foi, sem dúvida, um dos grandes impulsos que tive, tanto pela abordagem de indiscutível pesquisa e conhecimento - e nem por isso menos dramática e quase didática - dos assuntos inerentes ao efeito estufa, à desqualificação e à crescente inacessibilidade dos recursos hídricos, ao oxigênio gradualmente rarefeito e outras mazelas (lá se vão mais de vinte anos que o li e reli!), quanto pelo susto que ele me pregou, pelo realismo e a força de sua narrativa. Até hoje tenho meu exemplar em casa e devo admitir que, nas raras vezes em que lhe corro os olhos (há algum tempo não o faço), não me arrisco a enveredar pela sua leitura completa novamente, com um certo temor de reviver o meu sofrimento - lúdico, mas sofrimento! - e até uma não diagnosticada, mas sentida, inicial crise depressiva.

Deveria ser leitura obrigatória - nas escolas, no comércio, na indústria, nos campos, nas repartições públicas, nas ONG's, nas igrejas e em todo lugar do mundo onde a ínfima possibilidade de ameaça à integridade e à harmonia ambiental existe - este petardo profético-ambientalista do mestre Ignácio de Loyola Brandão (foto), para que possamos começar a esboçar a nossa própria salvação.

Oxalá não se me cerrem os olhos antes desta ansiada insurreição!...
Com um ecofraterno abraço,

Nísio Miranda.

Abaixo, entrevista do autor, concedida com exclusividade para o portal "Conservação On-line", da Fundação O Boticário, em http://internet.boticario.com.br/portal/site/fundacao/

VINTE E CINCO ANOS DE "NÃO VERÁS PAÍS NENHUM", de Ignácio de Loyola Brandão.
A realidade imitando a ficção




Um dos mais consagrados escritores brasileiros, Ignácio de Loyola Brandão, teve seu livro "Não verás país nenhum" relançado pela Editora Global, em edição comemorativa aos 25 anos da obra. Em tempos de mudanças climáticas, o cenário do livro de ficção – com a natureza destruída em nome do "progresso" – nos mostra uma realidade que começa a se desenhar hoje.
Confira abaixo a entrevista do autor, concedida com exclusividade para o Conservação On-line:
CO - Quando a primeira edição do livro "Não Verás País Nenhum" foi lançada, em 1981, você já tinha feito uma pesquisa com notícias de catástrofes ambientais e doenças causadas por poluição, por exemplo, para ambientar o romance num futuro cronológico. Como foi seu contato com essa realidade social e ambiental na época?
Ignácio de Loyola Brandão - Tinha feito uma enorme pesquisa em torno dos assuntos principais que permeiam o livro: clima, hidrografia, buraco de ozônio na atmosfera, poluição, devastação e doenças estranhas causadas pelo sol, pelo aquecimento e pela poluição. Principalmente as doenças me assustavam muito. Levei dois anos lendo todos os tipos de estudos sobre o assunto, li até mesmo a mitologia da árvore, o simbolismo da floresta para o homem, o sentido religioso da árvore, o significado da água para o ser humano. Diria que a bibliografia para o livro oscilou em torno de uns 80 livros anotados, rabiscados, lidos e relidos. Ao mesmo tempo, devorava todos noticiários que envolvessem esses assuntos em jornais, revistas, panfletos, folhetos, teses. Reuni cerca de 4 mil recortes sobre os temas. A professora da PUC de São Paulo Cecília de Almeida Salles teve todo esse material em mãos e preparou inclusive uma tese de mestrado em torno da Genealogia do manuscrito. Foi o primeiro livro sobre o assunto publicado no Brasil.

CO - Alguns aspectos ambientais descritos no livro parecem estar acontecendo nos dias atuais. Dias mais quentes, racionamento de água e de energia, florestas desaparecendo. Você imaginava que isso pudesse virar realidade num futuro tão próximo?
ILB - O escritor, o ficcionista explora seu tema elevando-o ao máximo, até o ponto em que ele se torna quase absurdo. A cada situação eu esticava a corda a sua tensão maior, mesmo porque, olhando em torno, não via nenhum gesto, nenhum movimento por parte da elite dirigente, não via manifestações — escrevi o livro em meados dos anos 70 — que alertassem a população, orientassem, gritassem: basta! A não ser os trabalhos do gaúcho Lutzenberger e de Ruschi, no Espírito Santo. Pensava: se continua assim, vamos chegar onde? Minha intenção era assustar, provocar uma reação de terror, para que as pessoas lendo o livro dissessem: não podemos permitir que isso aconteça. E, no entanto, está acontecendo, virou realidade. Vejam as denúncias dos jornais ainda nesta semana: a Amazônia continua a ser devastada.
CO - Você acredita que a edição especial de relançamento do livro, 25 anos depois da primeira edição, contribui para reforçar o alerta à sociedade sobre a questão ambiental – embora o livro seja um romance de ficção?
ILB - Minha responsabilidade como escritor é alertar, mostrar o mundo que vivemos, a vida como ela é. Em Não Verás País Nenhum temos uma não vida. Acredito que o movimento que está sendo feito em torno desta edição especial é uma das formas de alertar, de dar um grito, de dizer: vamos nos mexer, nos agitar, gritar, agir para evitar a catástrofe. Embora ficção, o romance tem sido visto quase como um documentário. O que mostra que já existe um espírito, uma consciência em torno de tema tão grave.
CO - Oportunidades como o debate na FNAC (que acontecerá em 5 de dezembro, na FNAC-Barigui, em Curitiba), por exemplo, podem expor esse cenário como ponto de partida para repensarmos nossa relação com o planeta?

ILB - Cada gesto, mínimo que seja, contribui para o esclarecimento, a conscientização. Um evento como este na FNAC, instituição que tem prestígio, levada para a frente por outra instituição — porque, convenhamos, o Boticário, mais do que uma empresa, é hoje uma instituição — são fundamentais. Uma ação aqui, uma palavra ali, um texto, uma fala, um livro, tudo é essencial, tudo passa a fazer parte de uma engrenagem a fim de que possamos ver algum País no futuro.
CO - "Não verás país nenhum" obteve grande sucesso, assim como outras obras de sua autoria. Ganhou inclusive versão em teatro, sob direção de Júlio Maciel. Você acredita que a literatura e as artes em geral são capazes de mobilizar a sociedade para uma consciência coletiva? Na sua opinião, a mudança de hábitos visando a sustentabilidade do planeta é uma realidade possível?
ILB - Mais do que possível. Acredito no ser humano. Não acredito que o homem seja suicida. Há um leve movimento destinado a reverter tudo. Agora, a coisa começou a assumir um contexto global. O Nobel dado a Al Gore tem um significado. Começamos a nos mover, ainda que lentamente para nos salvarmos. Mais do que nunca a mídia se debruça sobre o assunto. Veja o enorme caderno dedicado ao Amazonas pelo jornal O Estado de S. Paulo no domingo, dia 25 de novembro. Estamos começando a ter medo, e isso é bom. Começamos com o pequeno gesto de não atirar lixo na rua, continuamos reciclando lixo, tratando de usar detergentes que não agridam o meio ambiente, as empresas cuidam da emissão de gás carbônico, o Ministério do Meio Ambiente torna-se dia a dia mais exigente. Do micro chegaremos ao macro.
CO - O tema meio ambiente percorreu outra obra sua, o "Manifesto Verde", que aborda a ecologia partindo de fatos reais ocorridos no Brasil e no mundo. É um livro que incentiva o leitor a repensar seu comportamento diante da natureza. Essa é uma preocupação presente em sua vida?

ILB - Tenho ainda outro pequeno livro infantil, O Homem Que Espalhou o Deserto, forte, que fala do assunto. Diria que ele é uma das preocupações, desde que senti a faca na carne, pesquisando tanto e me informando. Lembro-me de um fato da infância. Adorávamos brincar num riacho em Araraquara, interior do estado de São Paulo, porque era uma época em que quase não havia brinquedos. Ao menos não havia a exorbitância que existe hoje. Tínhamos de inventar, de usar a natureza. Vivíamos em total contato com a natureza. O rio era maravilhoso, nadávamos, fazíamos ilhas, pontes, tudo. Um dia, começaram a jogar esgotos no riacho, as águas passaram a feder, os pais, preocupados, proibiram os filhos de ir brincar. A gente ia brincar e saía cheio de merda. Um dia, vimos que tínhamos perdido o nosso maior divertimento, o grande prazer, a vida ficou mais chata, triste. O rio passou a se chamar Rio das Bostas. Odioso, mal cheiroso. Foi o primeiro contato que tive com o problema. Tudo isso me veio à cabeça quando escrevia Não Verás. Não quero, simbolicamente, que a gente veja o mundo mergulhado no excremento.
Serviço:
Não Verás País Nenhum - Edição Comemorativa 25 Anos
Autor: Ignácio de Loyola Brandão (Global Editora)
Para comprar o livro, acesse o site http://www.globaleditora.com.br/