sábado, 6 de novembro de 2010

Salão do Automóvel: O Diabo reza Ave Maria

Por Celso Dobes Bacarji, especial para a Envolverde

(www.envolverde.com.br)

As preocupações com a sustentabilidade sobem ao palco de um dos templos da indústria automobilística mundial, o Salão do Automóvel. Mas o vilão da história, o combustível fóssil, ainda tem quilômetros de vantagem.

O 26º Salão Internacional do Automóvel de São Paulo, que acontece até o dia 7 de novembro, no Anhembi, apresentou as últimas novidades da indústria automobilística na tentativa de tornar o carro um produto mais sustentável. A abordagem das montadoras tem acompanhado as tendências mundiais no que se refere à responsabilidade social, isto é, elas começam a se preocupar com os impactos do carro em todo o seu ciclo de vida. Algumas avançam para uma ação integrada de sustentabilidade, baseadas no princípio do triple bottom line. Entre elas, Renaut e Toyota dedicaram mais espaço para suas ações sociais e ambientais.

A Renaut, por exemplo, lançou no Salão o Instituto Renaut do Brasil, que passará a ser responsável por todas as ações de responsabilidade social da empresa. O evento contou com a presença da diretora mundial de responsabilidade social do grupo francês, Claire Martin. O Instituto Renault atuará em quatro frentes principais: educação, sustentabilidade ambiental e mobilidade, segurança no trânsito e desenvolvimento social, por meio de ações planejadas, que acontecerão, inicialmente, no entorno onde a Renault atua, ou seja, nas cidades de São José dos Pinhais, Jundiaí e São Paulo.

O novo Instituto herdará projetos da empresa que já estão em andamento, como o “Árvore dos Sapatos”, que atende cerca de 200 crianças por mês, incentivando o hábito da leitura por meio de contadores de histórias; o “Renault Solidária”, em parceria com a Associação Borda Viva, que visa a formação profissional de jovens da comunidade; o Renault Experience que oferece aos estudantes informações detalhadas de todo o processo que envolve a criação, a produção e a venda de um automóvel; o projeto Segurança no Trânsito, que estimula as práticas de direção segura; e projetos na área de desenvolvimento social, em parceria com a Associação Borda Viva.

A Toyota também dedicou um espaço para mostrar suas iniciativas sociais e ambientais, desenvolvidas através da Fundação Toyota do Brasil, criada em 2009 para gerir ações como o “Projeto Arara Azul”, com sede no Pantanal sul-mato-grossense, que monitora aproximadamente 3 mil aves, espalhados por 47 fazendas da região, e o projeto “Toyota e a Mata Atlântica”, criado para atuar nas áreas de Reflorestamento, preservação de áreas ameaçadas, educação ambiental, sensibilização e multiplicação e no incentivo ao programa de voluntariado Amigos da Mata Atlântica, em parceria com a Fundação SOS Mata Atlântica.

Mas a grande vedete desta edição do Salão do Automóvel é a tecnologia. Com o computador a bordo, os dispositivos eletrônicos avançam sobre todas as partes do carro, do para-choque dianteiro ao traseiro, e, como não poderia deixar de ser, tem papel fundamental na tentativa de reduzir os impactos ambientais dos automóveis. A maioria das grandes montadoras apresentaram inovações tecnológicas com esse objetivo, entre elas, carros ou protótipos exclusivamente movidos a energia elétrica, soluções eletrônicas de redução de consumo e emissões, modelos hibridos e carros-conceitos, que utilizam hidrogênio como combustível. Sem falar no uso de materiais alternativos, recicláveis, como o alumínio e o plástico.

A maioria das inovações “verdes”, no entanto, concentram-se nos carros mais populares. O uso exclusivo de energia elétrica, por exemplo, gera veículos compactos e leves, capazes de alcançar velocidades em torno de 100 km/h, como o FT-EV da Toyota, que mede menos de três metros e pode levar até quatro passageiros, com autonomia de 80 km. É o caso também do carro-conceito elétrico da Honda, o EV-N, que tem como diferencial um painel solar no teto, que ajuda a carregar as baterias.

Outro carrinho elétrico compacto é o i-MiEV, da Mitsubishi, que já vem sendo produzido em série, no Japão. O veículo pode ser carregado em uma tomada de 110V ou 220V. Possui 64 cavalos, atinge velocidade máxima de 130km/h e tem autonomia de 160km. Entre os equipamentos, vale destacar o ar condicionado, navegador GPS, air bags, freios com ABS, direção elétrica, entre outros itens. A Nissan apresentou o Leaf, anunciado como o primeiro veículo 100% elétrico a ser comercializado em grande escala, com autonomia de 160 km. Está programado para chegar aos mercados norte-americano, japonês e em alguns países da Europa no início de 2011.

Os carros maiores apresentados até agora em geral são hibridos, isto é funcionam tanto com motor a combustão quanto com motor elétrico. Entre os que já estão sendo produzidos em série destacam-se o Fusion Hibrid, da Ford, que chega também ao mercado brasileiro. O carro funciona com um motor a gasolina 2.5 e outro elétrico acoplado com um gerador, integrados na transmissão, e uma bateria de níquel-metal. Com o motor elétrico, pode chegar a uma velocidade de 75 km/h. Para carregar a bateria, o hibrido da Ford utiliza um sistema de “freios é regenerativo”, que recupera energia desperdiçada na frenagem. É um carro que custa R$ 134 mil, mas promete um consumo médio de 13,1 km/l de gasolina, o que é semelhante ao consumo de um carro popular.

A Peugeot também apresentou um protótipo de carro híbrido, o RCZ Hybrid 4, que deve ser lançado na Europa no próximo ano. Tem um motor 2.0 L diesel de 165 cavalos, auxiliado por um movido a eletricidade, e tração nas quatro rodas. O motor a combustão fornecerá tração para as dianteiras e o propulsor elétrico dará energia para as traseiras. A Audi prepara o lançamento do A1 e-tron, que possui um motor elétrico na dianteira e outro a combustão na traseira. A GM não trouxe para São Paulo, mas desenvolveu nos EUA o hibrido Volt, cujos motores funcionam de forma alternada, com uma autonomia para o elétrico de até 80 quilômetros.

Mas, a rigor, o carro elétrico, mesmo o hibrido, ainda não chegou a um nível de eficiência capaz de credenciá-lo como um substituto para os carros a combustão. Nos EUA e Europa, por exemplo, consumir energia elétrica é apenas uma forma indireta de queimar combustível fóssil. No caso do Brasil, que tem a opção do etanol, um combustível que além de renovável reduz em pelo menos 50% o nível de emissões, as montadoras não são estimuladas a produzir o carro elétrico, tanto que a maioria delas vem desenvolvendo rapidamente motores bicombustíveis para lançar seus produtos no país, a exemplo da Kia, que lançou no Salão do Automóvel o Soulflex, uma versão bicombustível do Soul.

Para os especialistas, o carro elétrico poderá entrar em linha de produção por volta de 2020, com possibilidades de substituir a frota atual somente depois de 2050, isto se a tecnologia não providenciar uma opção mais sustentável, como prometem as células de combustão movidas a hidrogênio. Até lá, temos ainda muito chão para rodar com motores movidos a combustível fóssil ou biocombustível. (Envolverde)